Imagem: Giorgia Napoletano
/ por Anderson Dantas /
(TRIÁDICAS)
(1º. Ato)
Quando forçou a cabeça calva pelo caminho do ventre materno um anjo horrível arranhava seu ânus nas pétreas árvores do bosque que se incendiava.
Nasceu dessa forma de aborto um assomo que brotava junto a espinhos enegrecidos, e bêbado de ópios cantou pela primeira vez seu jorro de pétalas volúpicas. Pardacentas crianças vinham-lhe pintar o rosto de vômitos negros.
Crescido nesta alba cristalina e superadas manhãs, desabou assim para os campos celestes de seu segundo crime.
(2º. Ato)
Estranhos animais ardiam-lhe o peito retalhado
de feridas rubro-escuras.
No mergulho viveu com terríveis tubarões
oleosos de crueldade marinha.
E soube cometer o adultério nas virgens cores
dos arbustos crepusculares.
A espada abriu o coração em chamas e verteu
de Si uma escada de pássaros.
Na popa partiu-se um sopro que poderia ter
sido o amigo mortificado.
Arrojou-se a carne calcinada da glande nos
velutíneos lábios da puta.
(3º. Ato)
Os mortos em fila
aos frangalhos despiam-se.
suas mãos azuladas
carnicentas de nódoas
eram cariciosas asas de esmolas
e assim se repetiam
nas tardes caídas
sempre sendo dores
pelos séculos e séculos
contumazes de seus ossos.
um perfume hórrido fechou o tanque.
***
Anderson Dantas é poeta e escreve em Álbum Zútico. Também participa, com outros mallarmagos, do coletivo Língua Epistolar.
Livro Schatten – Gravuras nocturnas (2001, EdUFSC).