os interrogatórios
pinturas de Farbod Morshed Zadeh **
calado estava/ calado continuou (ela falava falava falava até quase a exaustão dos nervos dos músculos das cordas vocais já às 4 da manhã entre choros bobos e solavancos a troco de nada seguidos de mais e mais e infindáveis tempestades em copos d'água e terremotos sob a mesa da sala entre pratos de salada e magias de encruzilhada) mas o silêncio era mais pra ele um desejo algo que almejava era uma ficção ali o sonho dourado porque ele em certo ponto disputava também o palco pouco intacto a palafita fina daquelas falas trágicas ao mesmo tempo chatas simplesmente não conseguir deixá-la a sós com a sua própria voz da razão o frustrava talvez assim se escutasse (quem sabe) mas às diabruras de dúvidas tão absurdas jorrava uma fala incrivelmente inútil de nada adiantava julgar ter descoberto tudo de um dia pro outro no outro quando não se enxerga a si mesmo a fragilidade a pobreza da alma as cartas do jogo ele pegava no ar e jogavam juntos ele e ela esse jogo ágil a batalha dos discursos e nisso eram cúmplices às avessas um pescando na fala do outro a falha isso atravessando a madrugada inteira até não aguentarem mais os blefes os breques os tabefes já nem sempre inéditos e isso cansava tanto tanto tanto e ia angustiando os dois que ainda sobrava energia (um segundo e terceiro fôlegos juntos) pro sexo trágico até quase a hora de acordar e irem trabalhar como dois zumbis em trapos de cansaço mal dormido ainda remoendo (algo entre masoquista e sádico) quem foi o mestre da disputa
** Farbod Morshed Zadeh nasceu em 1974 no Irã,
é mestre em pintura pela Universidade Azad de Teerã,
onde leciona atualmente.