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Screenshot The Neon Demon |
pensa nas estruturas de carbono
que do seu corpo continuarão
a viver, a sustentar
pensa na cor do sangue
pequenininho
a morte é um tangram
vermelho___
Deus croupier de folga
não se faz de rogado ao sorrir a banguela
se espraia pelo céu da boca leporino
alcança o crânio acéfalo jamais natimorto:
___
caboto que é caboto
prova na terra a proximidade do rio.
Teme,
mas teme o que não existe.
um marginal a se guiar por fronteiras,
horizontes viciados pelo que não está.
Teme,
mas leva nos braços um buquê de músculos.
O grotesco de um náufrago de lagoa,
mas nunca mais a graça de um Baudelaire.![]() |
Screenshot Aguirre |
ali repousa noutra retina
uma imagem dentro
dói imitar os detalhes da fécula,
reforçar as pontes quando esfria___
estas aulas de como
manobrar o desvio
esfolam a mão
& tentam criar a reta
míope
viado
desempregado
irrisório
___
arrancar as unhas
embora tortura
eficiente
se mostrou, por fim,
impraticável
— De que nos serve
a verdade,
se as taças estão sujas?
— É saber comum
que lavar direito
privada ou escumadeira
requer unhas, prefiro
louça limpa
a confissão.___
peito glabro (largo)
com a legenda passivo
sem mais detalhes
além de querer local
as orelhas fugindo do rosto,
os lábios tão parecidos
o de baixo com o de cima,
bigode incipiente
pescoço curto,
nome bíblico:
motel labareda,
consolo de bronze.___
eu
rastejo pelo único
mármore feio do mundo
de apoio os cotovelos e joelhos
me arremessam moedas vencidas
(aqui não chegam restos)
"aranha", me elogiam
não ganharão minha simpatia
pintaram de azul todas as grades
e gozam nuvens
empino a bunda intacta
dos que não precisam trabalhar
é preciso que se deitem
(quase não babo mais)
tenho uma joenete na bochecha esquerda,
a outra mantenho tão lisa quanta a bunda
te esperando fazer festinha
o mundo é cônjuge de ninguém:
você sabe onde me encontrar.___
caxumba na alma, ele disse
Na alma?
Sim.
que raro
Sinto que às vezes sobe
Pra cabeça?
Não, pro pau
mas ela fica nos pés?
Ela?
A caxumba.
___
não importa o quanto eu bata no cinzeiro
o quanto mire, o quanto pare a leitura
e me concentre
___
há miniaturas demais
sobre o móvel funcional
digamos ursinhos de pelúcia
sobre esta escrivaninha
___
cutelo hecatombe
jorra mais do que tinha
cutelinho hemorragia
um pouco mais do que tinha
deve dar
pro gasto
deve dar
pro desgaste
de viver
pro desgaste
de ter vivido
será?
o truque é não merecer
o tapete púrpura
o resto é encomenda,
pagamento prévio________________________________________________________________
Leandro Rafael Perez cresceu na divisa com Diadema, São Paulo, e hoje mora no centro. Fez linguística na USP, mas não ganha dinheiro com a área. Aliás, quem ganha? Mede 1m57. Tem 3 livros pela Editora Patuá, nesta ordem: lança além do real só, turnê a meio mastro e pau mole (prelo, 2017). Um poema seu consta na terceira edição impressa da Modo de Usar e fez uma série inédita para a sempre incrível revista online Geni, saudades. Email: perezlrp@gmail.com