Quantcast
Channel: mallarmargens
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

O Poeta e o Poema - Willian Delarte

$
0
0
Ilustração: Hord Beniamin



o suco de um coração moído não embeberá a poesia
a razão em sóis diluídos não a clareará
o poeta morrerá sem que o poema:

expurgue uma só emoção
arranhe qualquer questão
coce dois ou três dilemas

(nenhum verso poderá salvar a alma do poeta ...)

imprestável, descartável,
o poema é adereço inútil em sua sombra,
uma droga anti-analgésica que lhe consome
como um jeito doce do amargo saborear

(e não o salvará ...)

o que nasce da sua vontade de libertação
é opacidade na representação do dia -

do ritmo,
do belo,
da própria alma da poesia

(e nunca o salvará ...)

o poema é um espectro fosforescente numa noite escura
o poeta, de binóculos, só enxerga o que não vê
na varanda onde o poema dorme sem textura
um dedo o tateia em braile, mas não lê

(e jamais o salvará ...)

surgirá como uma azia sutil
qual célula gorda e cabeluda
no pé da garganta, que abriu
uma fenda entre o cérebro e a bunda,

e não
nunca
jamais o salvará,

ainda que o mundo possa revelar
no espontâneo assombro que o eleva,
tal como um ponto de luz pode tornar
evidente o poço sem fim das trevas


Willian Delarte



Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548