O naufrágio
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Naufrágio, Goya, 1793. |
a olhar O Naufrágio, de Goya
ergueu-se na arquitetura da noite
um grito espalmado
estendido através dos braços para o alto
saído de entre os seios nus no orvalhar
uma natureza tempestuosa e soturna
impressa no pedregulho das ondas
tingida pelas ondas azuis negras
no painel corpos
e na alma dos corpos
o direito à liberdade
carregado na proa submerso
na linha escura do horizonte
agora estamos longe
de tudo dista. vê!
uns nus estendidos na couraça do mar
outros jogados no vaivém dos gritos
ainda outros já impressos
na manta negra da noitepoema para o 11 de setembro
A Wislawa Szymborska
com olhos de cristal líquido
coloridos
míopes de cinza e preto
vimos ruir dois mundos de espelhos
cacos corpos corpos cacos pó
o que disseram dos queimados
e dos caídos vivos
procurando eternidades
nada
decidiram apenas
por um último instante de fama
de promoção pessoal anônima
o desenho da vertigem
o silêncio num grito de fuligem
que se repete na mente líquida
com a beleza mais sublime
da nossa própria capacidade
* * *
Pedro Fernandes de O. Neto (Lajes, 1985) é professor, crítico e escritor. Atualmente cursa Doutorado em Literatura Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem na Universidade Federal do Rio Grande do Norte com pesquisa em José Saramago e António Lobo Antunes. Em 2012, publicou seu primeiro livro, "Retratos para a construção do feminino na prosa de José Saramago" (Editora Appris). É autor ainda dos livros de poesia "Sertanices" e "Bardos", títulos inéditos, e do e-book "Palavras de pedra e cal", lançado de forma independente em 2009, pelo Selo "Letras in.verso e re.verso" reunindo trabalhos publicados em diversos sites, jornais e revistas. É colaborador para diversas mídias escritas do Estado, tendo publicações em jornais como "De Fato", "O Mossoroense", "Correio da Tarde" e "Tribuna do Norte". Mantém o blog Letras in.verso e re.verso.