Quantcast
Channel: mallarmargens
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

"a gruta das sereias de onde venho ainda reverbera" - 5 poemas de Laura Moreira

$
0
0
"Ophelia", de Robert Walker

TEA TIME

A mermaid swimming in a tea cup
a mermaid
swimming
in
a
tea cup

white
blue
purple
pink porcelain

a mermaid swimming
in water
perfume
perfumedwater

a mermaid swimming in a tea cup
in flavor
in hot perfumed water

she swims

a girl drinking in a tea cup
a girl and a mermaid
a girl drinking
a mermaid swimming
in tea in a tea cup

the girl stares at the mermaid playing
the mermaid stares at the girl staring
neither of them understand the situation
both of them stare at each other in the eye
an earth-eye
a water-eye

will the girl drink the mermaid?

"A Shipwreck", de Sergey Lesnikov
MARUGEM


Armado cavaleiro
de lançespada armado
cavalgando de pau
soberba barca-embarcação

lançado ao mar
turbulento
de turvas turfas
e barroso barro

lute para daí
sair vitorioso
lançando-se ao alto

por douradas ondas
escorra até que
última gota de
cróceo sabor
seu corpo liberte

lute contra o revoltoso mar
deslizando em
espirais de fios d'água
dando voltas e voltas
até não mais poder
desfalecer ou morrer

Perder talvez vá,
cavaleiro
já que polvo-pólvora
pode fazer com que sucumba
sem nem ao menos perceber
a densa escuridão recaindo
sobre seus densos olhos

Ferruginosas ondas
cobrir-te-ão
totalmente
e tolamente
buscará desvencilhar-te
para enredar-te ainda mais

encontrar-te-á em meio a
avelãnadas ondas
destituido de tua amadeirada barca
submergindo em vagas de nada
de funlgências que farão com que vejas
com teus olhos que já não mais veem
Ah, cavaleiro
solitário cavaleiro
perdido em meio à violenta batalha
lutando por uma causa
que perdida já está há tempos

Deixa este vasto oceano
que agora de ti se alimenta
levar-te para suas profundezas
de fulguroso breu

Não
gritas em vão
Posso ouvir-te o clangor
que de ti
como súplica brota

Pobre de ti
que lutas por nada
que te feres
por nada

Resistir
resistir
mais não pode
pois caso as castanhas cascatas
para o fundo não te draguem
descoradas serpes
que a dormir se encontravam
enrolar-se-ão
em membros agora
descarnados
e arrastar-te-ão
para um fundo
um fundo que não tem fundo
que não tem nada
que tem tudo que tem vazio nitescente

Seus aquosos olhos
que apenas na escuridão divisam formas
sentir-te-ão
na superficie sublevada
em que bates braços
bates pernas
bates a ti
em desespero
em meio a batalha já perdida
e já ganha

Já sentes os ofídios
Posso sentir
no íntimo do mar marugem
movimentam-se
calmamente
eles pressa nunca têm
têm fome de ti
Esperam pacientes
rindo de ti e de teus simplórios membros
que continuam a tentar salvar-te

Quando estiver exausto
agarrar-te-ão
dragar-te-ão
roubar-te-ão o fôlego
e farão com que teus lábios se abram
em perfeito círculo sem som
subermergido já neste mar
com serpentrelaçada
entrelaçada em ti

Chupar-te-ão a carne descarnada
até que apenas o branco de teus olhos
e o branco de teus ossos reste
gargalhando da força vital
que de ti se desprega
se descola

Morte é o que lhe espera
apenas um guincho
abafado
sufocado
é o que de ti sairá
como último soprovento
que teu espírito
às alturas guiará
para em seguidas voltar
em segundo sopro
preenchendo-te
enchendo-te
até sentir a morte novamente

"Metamorphosis of a Metaphor", de Stephen Kelly
METAMORFOSE


Herdade herdeira de campesinos Campos

Brando umbral bradando besta que se torne
ao menos monstro fera rapina ave
que devore dilacere delicada
que torne picada tosqueada finura
e cubra de casca pele pelo
torne quem sabe rala cabeleira
em jubarte juba jala
exalando quente bafo de
ferina fera ferroada por férreo ferrão

palma em pata em garra
com grande gatázio gris
oculte-se

olhos de serena sereia sejam vistos apenas em sonata serenata
e espevitado esqualo enviesado seja entrevisto
quando da calmaria, recuada, encontrar-te

pés assim como palmas sejam pau polas
para aqueles que daqueles aquém averiguam
a cova cavar cavando cavidades carnais
em superficie insonte

Oh sei que tenra tropeças em lento tracejar de tranças
e que deles desenhas idealização desajeitada
entretanto entre tanto mal mortal
deve indumentária animália entrajar
para lidar em lida lindamente

Busque aos braços policromasasas acomodar
e que dáctilos tintos tintas matizadas entornem
cróceo róseo em deleitável cenário
coradas trevas em tenebrosa testilha

deve-se mostrar de amante diamante
e de justador dor aterrador

Deve ser duplo-ser
de duas almas fecundadas
nato inato nativo
capaz de como fera em feira terror tramar
e panapaná em púlpito público perfeição papear

Ser dupluno e unoduplo
abarcado nesta barca embarção embargada
em mundo mato
de benigna malignidade e caridosa crueldade
De moderado bárbaro
a indômito fleumático

Arte de Kasia Derwinska
EM POÇA DA


Ca.
     .
     i                              tou
e ninguém        van
                me le
fique                                     
          e    p    r    a      a     a
             s    a    r     m     d
no
      c h ã o
como    
              poça                    céu
          refletindo                e
            d'água                 terra
                                            e
                                            u   e  nada
"The Little Mermaid", de Gabriel Pacheco
TRADUZINDO

My scorpion head
is full of
minotaureous labyrinths

I'm trapped
within my self
lost in a reality
constantly
translated into unsound

The mermaid cave
where I came from
still holds
the unlistenable echos of
my questions chants
and merfolk's answers

I some-
how was able
to hear them
not

Now
that I need
those answers
they have become
sparkling water
that fulfils the
Minotaure

I access
nothing

I lost the tail
that connected me
to the
Water Mother

Although I still feel
feelings of that no-
touchable
nonexistent
creature
dripping through me

I lost my tail
I lost my
I lost
I

As as revenge of the loss
I'm obliged
to walk around earth
with a huge
water bowl
That
constantly
comes over me
reminding me
of a chant
that I have never heard or sang

Oh, how I wish
to once more
see that
tail
that perhaps
I have never had

Oh, how I wish
That I'd die to
once again
feel
inside my
scorpion
fulfilling the
labyrinth
and lighting
the passages
that I will
never
go through

*

Minha cabeça escorpião
repleta de
minotaureos labirintos
se encontra

Atrapada em mim estou
Atrapada a uma realidade
constantemente traduzida
em algo intraduzível

A gruta das sereias
de onde venho
ainda reverbera
os inescutáveis ecos
de minhas questões canções
e as respostas do povo do mar

Eu
de algum modo
capaz fui e não
de escutar
respostas-
perguntas

Entretanto, agora
peroladas gotas
se tornaram
gotejando no
Minotauro

Minha cauda perdi
aquela que com
Mãeágua
me conectava

Ainda sinto o aveludado toque
da intocável criatura
pingando nas minhas
entranhas labirintos

Eu perdi a minha cauda
Eu perdi a minha
Eu perdi a
Eu perdi
Eu

Castigada
forçada sou de levar
de água
reservatório
viajando o mundo
a tocar o que tocar mais
não posso

Molhada no exterior
enquanto
com úmidos olhos
desejo úmido
o escorpião 
que capaz será
jamais
de ouvir o canto
que nunca
ouvido ou cantado
foi

Não sei mais
à caverna
chegar

Nem ao menos
sei se encontra-
se mar
se terra
se nada

Se nada
tanto melhor
Tudo minotauro
se transforma

Labirintos não
esses nada nunca se
tornar poderiam
Já que realidade vi-
ve



______________
Laura Moreira foi criada em São Lourenço, mas atualmente vive em Belo Horizonte. É estudante de Letras com ênfase em Estudos Literários da UFMG. Possui também grande interesse pela área de tradução, principalmente de poesia e contos


Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548