[a Olivier Messiaen]
1
há todo
um reino de caos
cada qual diverso aberto
cada qual um resto
cada qual poroso em
que não estou
2
o mundo é morto num álcool sem vida
em que nada habita –
jarreta imunda navalha expressa
pequena de mim
serena na falta de algo
em alguém
3
recorto o campo rude até
que o fundo chegue
e engolfe o tempo:
trilhas, tufões, latitudes
4
o modo desvia, navega dentro
desde sempre mesmo
que nem tanto
5
o rio me cabe se cruza a linha
o estro, o gosto, o riso azul
que delira
6
então eu sigo e não preciso
tudo é longo e me constela
crio e lavro detritos
7
em mim tudo pondera
nada a ver com o que havia
quase sempre em que se
pode ir por dentro sem
esforço numa busca de
dar certo
In: A grande noite perdida (Bookess, 2018).
____________________
Jorge Lucio de Campos é poeta, ensaísta e professor da ESDI/UERJ. Publicou os ensaios Do simbólico ao virtual (1990), A vertigem da maneira (2002), A travessia difícil (2015), Lembretes filosóficos para jovens sábios (2017), O império do escárnio (2017) e as coletâneas Arcangelo (1991), Speculum (1993), Belveder (1994), A dor da linguagem (1996), À maneira negra (1997), Prática do azul (2009), Os nomes nômades (2014), Sob a lâmpada de quartzo (2014), Paisagem bárbara (2014), Através (2017), Véspera do rosto (2017), O triunfo dos dias (2018), A grande noite perdida (2018) e Desimagens (2018).