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"enquanto galopo, cavalos" - texto em prosa de Guilherme Mateus

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Arte de Vasko Taškovski



enquanto galopo, cavalos

em minha cabeça monto em um cavalo, um tridente na mão direita sem serventia e duas galáxias para descobrir. nu, sem o tridente na mão, pra isso ele servia. sim, porque algumas coisas servem para não servir, e é assim. em minha cabeça três cartas de tarô viradas sobre a mesa e eu galopando aquele cavalo alado em um espaço que às vezes é lindo, escuríssimo, meio céu noturno, às vezes é uma torrente de ar e poeira que me golpeiam e quase caio naquele solo asco que me lembra o que é crescer. e é assim. em minha cabeça uma música com letra densa e uma melodia deliciosa para dançar, como se fosse uma alegoria para a vida. e é assim. em minha cabeça. em minha cabeça. meu cavalo pede água, para no espaço e faz um movimento com a cabeça como se dissesse que chega, não dá mais, e eu entendo que é preciso uma pausa no caminho, mas poxa não desista assim comigo, senão não galopo ou ando ou voo ou nado ou nada porque simplesmente não dá e eu que digo chega. em minha cabeça alguém em minha cabeça água para meu cavalo e fôlego também em minha cabeça vento cabeça em minha cheiro cabeça em minha cabeça perfumes. e é assim. em minha cabeça monto em um cavalo, não o mesmo cavalo mas outro, porque em minha cabeça as imagens mudam sem permissão e aquela água espera a sede desse ou do próximo cavalo. e é assim. tudo tão pensível, isso, pensível é a palavra que deve existir com meus cavalos e galáxias e poeiras e cartas de tarô e e e. dançamos eu e meu bicho com asas magníficas sob essa luz linda que é de uma lua que apareceu agora linda em minha cabeça. é uma dança complacente e entendível para ambas as partes. acho que choramos um pouco. eu acho que sim. ele tem olhos enormes e cílios gigantescos que deixam as lágrimas feito fossem diamantes escorrendo, e eu vejo e acho lindo e lambo aquela lágrima-diamante. e é isso. em minha cabeça meu cavalo pensa em alguém e rações e banho. ele sobe em mim e galopamos por algum lugar que não consigo descrever agora porque não não dá. há um silêncio muito bonito que nos acompanha durante esse tempo. encontro um tridente no caminho. sede. pausamos e ele entende que preciso. mantemos o silêncio. em minha cabeça cavalos alados e eu ou vice-versa ou um dentro do outro imaginando cavalos e tarô e poeira e galopes no espaço e perfumes e alguém, porque há sempre alguém e tridentes e torrentes de ar e poeira e fôlegos e neologismos e galáxias e serventias e não serventias e caminhos. sede.


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Guilherme Mateus: nascido em dezembro de 1994, potiguar, graduado em letras. desde cedo desfila pela escrita, a pintura e a fotografia como um escape – talvez uma tentativa de alcançar o outro e a si próprio. plural e singular: algo sutil e estranhamente harmônico entre o caos e o vazio.


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