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Lançamento e 7 poemas de "O Cochilo do Céu" de Marcel Fernandes

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/// Sobre: "O cochilo do céu" reúne 48 poemas, divididos em quatro partes. Marcel Fernandes transita entre o universo astronômico e o micro-cosmos diário singular. A imensidão compartilhada por estas realidades dá a unidade a obra. O autor paranaense explora a relação dialética que é existir e interagir no mundo a sua volta.

“A par desses traços exorbitantes (para usar uma imagem cosmonáutica) e inovadores da poesia de Marcel Fernandes, admiro também seu relacionamento sério com a poesia. O sentido apurado da cadência dos versos. A força anafórica como vetor de ritmos inumeráveis. A tradição como valor que se transfigura aqui e agora. O cochilo do céu não sucumbe à tirada espirituosa nem à concepção da poesia como jogo autocentrado que há tempos, entre os seus praticantes, vem resultando em mero virtuosismo metalinguístico. O respeito e a seriedade que o poeta dispensa à arte da poesia e que nos dá a ver em seu O cochilo do céu nada tem daquela gravidade retórica e afetada que as convenções literárias associam ao gênero. Seu apetite e seu amor críticos pelo poema mantêm sob controle essa disposição quase inescapável à ironia e ao cinismo a que estamos sujeitos – poetas e leitores – contemporaneamente”. 
Ronald Augusto– poeta e crítico literário.


O HOMEM


são como farpas atravessadas pelo desejo
húmus decomposto pela carne do destino
são cavalos cegos galopando pelas beiras
relâmpagos lufados pela existência
homens não são mais que instantes
roendo o futuro que não lhes pertence


A ESPERANÇA


há um animal que ri
selvagem
na atmosfera do dia
há um grito ecoando
labiríntico
nos mais altos céus
há o desejo
habitando os seres viventes
há o fruto
há um fruto
há uma sombra que envolve
o teu nome
há uma marca em tuas mãos
e dança quando olha pra mim


ESCURIDÃO


não pisam ainda os ventos
sobre as águas e rapidamente
a grama azul se espalha
sobre o mar e as nuvens suspiram
pela terra fértil

é outono e o globo terrestre
se contorce frente ao estranho
linguajar das algas

é frágil o sono dos penhascos
e melancólico o riso dos trovões

a espessura do momento exige
substância vasta, é escasso o vinho
que alimenta as plantas

a erva nova avista grande precipitação
os morcegos se enraízam na terra úmida
fecundando a clausura dos dias

a carruagem da noite se avizinha
é forte o aroma das cores no cio


NOVAS REFERÊNCIAS


essa coceira ruidosa entre os dedos da mão
essa coceira miúda, frágil, orgânica
desenha lembranças de quando fui mar
essa coceira prediz a queda da terra
e o nascimento do planeta aguado
ouço estalos! ondas quebrando meus ossos
é preciso escrever o manual da nova terra
é preciso ressignificar a vida terrena
rasgar os olhos das montanhas
lhes dar lições de como ser icebergs


ORQUÍDEA


você não sabe
o que é dobrar
uma primavera
você só entende
de invernos
de edredons
camisinhas
band-aid
merthiolate
e seriados

um cavalo atravessa furioso
esse lago
fundo dos teus olhos
galopando, galopando, galopando

você não sabe
o que são anzóis
você não sabe
o que é um cavalo

a saliva escorrendo da tua boca
escorrendo pelo canto esquerdo
dos teus lábios
vermelhos-sangue

uma isca escapando do anzol

você me chove e chove muito
chove imensa constelação
você não sabe
como molha dentro de mim
como boiam minhas entranhas
e afundam


TEORIA X


a cosmologia pode explicar o nascimento do universo do mesmo jeito que explica o controle da gravidade sobre nossos corpos
até o ponto de colidirem
a partir da colisão 
nada se explica
o fenômeno ainda é desconhecido pelos cientistas 
quando dois corações colidem propagam tsunamis gravitacionais 
nembeuys previu em terremoto no palácio tamanha energia propagada
os padrões vibratórios são frenéticos
astros se formam a partir da agitação das partículas 
oscilações de luz ocorrem nos olhares com muita frequência e o movimento dos corpos no espaço se tornam imprevisíveis


PONTO DE NÃO-RETORNO


absurdos matemáticos
distorções entrópicas
não há linguística avançada que o descreva
fórmula física que o explique
matemática que o calcule
a velocidade da luz por ele é descartada
não há velocidade possível para libertar-se do seu campo gravitacional
chegando em seu horizonte de eventos
qualquer matéria será influenciada por sua força significante 
haverá fricção significativa
o corpo será propulsionado ao ponto de não-retorno
essa ação fantasmagórica a distância
foi denominada pelos cientistas de amor
e figura entre os grandes mistérios da humanidade



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Marcel Fernandes nasceu em Antonina-PR, na primavera de 86. Além de poeta, é artista visual e apaixonado pelo universo e seus mistérios. Seus poemas já aterrissaram em diversas revistas literárias, como a Escamandro, Germina, Garupa, Mallarmargens,Parênteses, a americana Gramma Poetry e as portuguesas Enfermaria 6 e Piolho. O Cochilo do Céu (Kotter Editorial, 2018) é o seu primeiro livro. 



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