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5 poemas de Luiz Frazon

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ARCHYTAS OF TARENTUM

O que sabemos
de nós mesmos
é um pouco mais
do que uma chave de fenda sabe
sobre um parafuso:
é um jeito abissal
de enroscar o mundo
e prendê-lo, firme.
Um íntimo conhecer, profundo,
do seu nome ferroso,
a matéria que se abraça.
É lançar-se adentro
e entretecer o aço
sob pressão 
de mão alheia.



ESTATUTÁRIO

                                                                         “Olha tua obra.
                                                                           Olha a obra que é tua por ser feita à tua revelia.”
                                                                                                                                   Rodrigo Petrônio

Seguramos o sol
com força, na unha.
Não lhe damos folga abonada,
nem licença ou férias;
não lhe permitimos atestar
doença ou praga
na pele do seu nome de luz.
Queremos o sol
analfabeto em Marx,
quase escravo.
E são poucos os que o imaginam
rebelado,
vigorando seu ardor
e retorcendo a madrugada.
Forjando no fogo
imagem lúdica da meia-noite.


COMEDOURO

                                                                                    “Mourão, mourão
                                                                              Tome teu dente podre
                                                                               Dá cá meu são.”
                                                                                         parlenda de autor desconhecido


barganhamos com nossos nomes
a imagem
do que esperamos ser

no entanto, à conta-gotas,
somos traídos

o nome é a palavra que nos come.


EQUILÍBRIO (sobre Mateus 14)

Encanta-me
a fluência dos passos
sobre águas inquietas
sobrepondo traços
ao cortejo hostil:
inocência do mar.

Encanta-me
ainda mais
os passos cravados
no chão:

a malícia da terra
como mãe astuta
é sentir o outro caminho
percorrido em  segredo.


SOBRE ECLESIASTES

                                   “O patrimônio que mais nos pertence: as horas em que não fizemos nada.”
                                                                                                                                  Emil Cioran

Quando era menino,
de ensino fundamental,
a preguiça exigia-me
um “não” de adulto
para o que eu não queria.
Era quase um trabalho,
e era eu quem me servia:
me assinava carteira,
me pagava uniforme,
me mandava à rua,
a campo.
E como mau funcionário
eu nada fazia;
como bom patrão
eu me despedia.


Poemas de "O nome pela metade" (Patuá, 2017).




Luiz Frazon é Educador Social na cidade de Ribeirão Preto, SP. Cursou letras, apesar de não concluir o curso e hoje faz bacharelado em Educação Física e Esporte pela USP. Coeditou o Zine “O circense” entre os anos de 2003 e 2007. Participou de algumas antologias poéticas, publicou seu primeiro livro de poemas, Roçando água, em 2009 e em outubro de 2017 seu segundo livro, O nome pela metade, pela Editora Patuá. 





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