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6 poemas de "Um céu todo estrela", de Alex Dias

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então se fez fonte
o que só era toque.

um céu todo estrela
no encontro dos olhos,

um fulgor que enlaça
a calmaria da febre

onde o tempo se despe

e a carne clama um ato
ainda sem nome

***

procura-se o desassossego
das horas inquietas e úmidas,
a violada canção sagrada
a arder em desertos
        diários.

procura-se o incerto,
a secura ilhada do silêncio,
        o tédio das cidades fantasmas,
os caminhos sem saídas,
a íntima falta
que a memória não dissipa.

procura-se a mina – os passos
correm o campo, descalços:
a explosão única e precisa,
a limítrofe errância  
entre o plano e o precipício.

procura-se a voraz vertigem,
o sagrado impregnado do profano,
a humana redenção à vida.

procura-se o maior abismo
escavado no coração da terra,
do céu, no peito do aflito,

o fogo mais intenso e quase extinto,
o manancial do delírio,
a hora em que deflora a flor
        o inseto e tudo é lindo.

procura-se a loucura, o delíquio:
tudo aquilo a que o amor se lança
fingindo não temer o risco

***

ubuntu,
        meu coração desafia
                não ser um.

juntos, compartir o fruto.
nem mesmo as mãos
são só duas, quando estendidas
ao futuro.

bem mais em mim que o dobro
em tudo, revoluz, vislumbro o todo
e pó, que sou, solto pelo mundo.

seguem as dunas
e não duram eternas ao vento.
à margem do mar, marejado olhar suspenso,
aconchega a ilusão de um mundo tão pequeno;
até correr, pés, utopia, o espaço incalculável
do universo, quando esquecemos o tempo:

cemitério indesvendável do nada 

***

canto,
mesmo que o canto
não compreenda
os ossos todos dos ecos,

nem saiba
o sibilino mistério do assombro
de se evocar, em poucas palavras,
o mesmo e o novo,

como a água evoca a água
o ar o ar a terra a terra
o fogo o fogo a mulher a vida.

gesto o canto mesmo quando

 pareço silêncio

***

como se a casa fosse
de sua alma erigida,
sobre a forma que trouxe
à luz a sua própria vida,

é nessa casa que habita
meu ser que se recria:

sobre a forma que trago,
de minha alma ser a casa
onde nosso amor cultiva
uma troca de moradas,

que é a mesma casa,
a vida

***

agora o pouco
é tudo
o que nos resta.

agora é tudo.

é muito
pedir pouco.

agora resta
a vida e seus outros mistérios,

sua presença constante
e a fuga sempre certa
do tempo.

agora tudo 
é o que nos resta




Alex Dias é poeta, ator e gestor cultural. Autor dos livros de poesia Lírica Abissal, lançado pela editora Urutau (2016) e Um céu todo estrela, lançado pela editora Patuá (2017), é Coordenador de Programação do Sesc Birigui e mestrando em Teorias e Crítica da Poesia, pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da UNESP de Araraquara, com a pesquisa: Construção e utopia na poesia de invenção. Tem pós-graduação em “Gestão Cultural: Cultura, Desenvolvimento e Mercado” (2016). Possui graduação em Ciências da Informação e da Documentação e Biblioteconomia pela USP de Ribeirão Preto (2006). Fundou e dirige a empresa Osnáuticos – de Arte, Cultura e Educação – onde desenvolve projetos que englobam poesia, literatura, cinema, música e artes cênicas e visuais. Também fundou e coordena o "Poéticas – Laboratório de pesquisa e Criação Literária e Poética" e o projeto "Bagagem... Poesia!", voltado à mediação de leituras. Fez Magistério (2002) em São José do Rio Preto.

 
 

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