I
depredações
depredações
o medo que se esconde por detrás da música
do órgão
do peito
tempo é gaveta de ocupações
– desocupar o tempo –
sonho é palavra desajustada
fazemos gambiarras
com o belchior aprendi dizer dane-se
– dane-se –
encartada no jornal a realidade é um folheto que anuncia poesia e depredações
II
sexo e solidão a três
sobe a luz do mesmo poste
embacenta como todas as noites
com lua ou sem lua, com mais ou menos vida
que estava a luzir aquela esquina há bastante tempo
encontraram-se na mesma hora não marcada
mas sempre pontual
doidinho, celinha e lulu
um drogado
uma puta velha e viciada
e um viado metido a besta
ao ver doidinho, celinha abre um sorriso escrachado e com um sonoro tapa na bunda diz pra lulu
- hoje eu vou trepar e me chapar, ô coisa boa é fuder doidona, vem doidinho, vem!
Lulu esgueira-se e de rabo de olho diz, dar para aquele ali, meu cu nem treme
– pau é pau, é tudo igual, ficou duro eu engulo, disse às gargalhadas celinha
– e fuma! Lembrou-lhe lulu
a puta não se conteve e soltou
– me desculpa, bicha, mas priquito é priquito, faz milagres
ao cabo de meio baseado, doidinho enfia a mão na bunda de celinha, enquanto lulu passa a goma no baseado de modo lamber como se chupasse um pau
doidinho olha e diz, doido pra chupar um pau, né luluzinha, luís augusto!
– vai tomar no cu, fidirrapariga!
– eu vou, mas tu não vai, zomba-lhe doidinho
celinha pega o baseado e põe um peito pra fora do decote
celinha doidinho noite lulu e o poste
– trepada na esquina –
sexo e solidão a três.
III
nos escondemos para experimentar a liberdade
nos escondemos pra experimentar a liberdade
nas madrugadas nos nossos abismos particulares
amanhã se escreverão dias de borracha e chumbo
e depois de amanhã alguém apagará e escreverá novas histórias de afeto e coragem
nos escondemos pra experimentar a liberdade
nos abraços, nas ausências, nos braços do desconhecido
o bicho deseja carne poder e fotografias
pufpuf fotografias
pufpuf fotografias
a pintura começa em branco nascemos do nada
não acreditamos em nada e matamos
não acreditamos em nada e parimos
não acreditamos em nada e perdoamos
não acreditamos em nada e precisamos pedir socorro
nos escondemos pra experimentar a liberdade
existe um amanhã pela frente mesmo quando não se sabe nada
carregamos coisas, manhãs, anotações e roupas velhas que dão sorte
- sorte é um disco novo -
no meio de qualquer coisa eu sempre me perco entre o calor e a chuva rala.
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João Henrique Vieira é escritor, jornalista e produtor cultural. Natural de Teresina-Piauí. É formado em Comunicação Social (UESPI). Teve textos publicados em revistas como Academia Onírica, Roda de Poesia & Tambores e outras. Publicou de forma independente, em 2010, o livro de poemas “Olá, meu caro” (disponível na página facebook.com/olameucaro), e trabalha na produção de um novo livro de poemas. É idealizador e coordenador do Projeto Roda de Poesia Tensão, Tesão & Criação, que reúne poetas e produtores culturais contemporâneos teresinenses.