![]() |
dos silêncios
abismos profundos
as perguntas
sem respostas
frias rochas
em desfiladeiros
insinuam
ecos roucos
a perpetuar
além das encostas
tais setas
desviadas
da mira
são canetas
sem sangue
… penas mortas
voam abaixo
até onde alvos
são cestos
de papéis
(des)escritos
que, rasgados,
gemem
por falta
de gritos
Cicerices
Saturno, toma esta rocha, tenta emular a Jovis.
Engole-a pois, como engoliste outros teus rebentos. Satura!
Jovis não oscila mediante o desequilíbrio
da balança que pesa os justos
Tritura então esta pedra até o último dente, Saturno,
e te afogues ao sal que plantas nos olhos de Cibele.
… Pois Jovis crescerá além das fronteiras de Creta
entre nove musas, saciado pelas tetas de Amaltéia,
e há de transformá-la na Égide que o protegerá
das lanças espadas e línguas flechas.
Ainda desposará Juno, que dará à luz Marte
e mesmo a morte jamais o alcançará.
Eis que Jovis é luz, é o hélio, é dia,
a clareza, a veracidade
a olhos vistos desvendados.
Saturno, atenta ao vinho que bebeste
ao brindar com Jovis cada um filho
que engoliste.
Todos serão expulso das tuas entranhas
a fétido fel qual ainda regurgitas
enquanto te afogares até o derradeiro repouso.
Pois quando fores de encontro aos teus mortos,
a cada mais absoluta verdade vomitada - e eternizará.
arquitetada com linhas & pêndulos
à mercê de grávida gravidade
em constante equação
assim é a vida
extrato da natureza desperta
em proporções milimétricas
desde os cacos e rejuntes
até os mosaicos
às frases, poses, crases & crises...
credo! cruzes!
vitrais e matizes em busca da luz
sagradas famílias em perpétuo conflito
com o céu e a terra
... do zero ao infinito
gigantesca obra inacabada
monumento ao eterno não findo
trecos & tropeços caros
remodelados de paciência versus tempo
cores & curvas projetadas
além dos arcos & retas
risco, insight e cisco
no olho de um deus distraído
salvação
o sal do dia deságua
pela face estática
e mãos inertes
ao carregar o bebê moribundo
de pernas quebradas
abatido já em seu primeiro voo
a pena e as penas confundem-se
na vã tentativa de ressurreição
quando o pássaro respira
ofegante
pisca espaçada e
len ta men te
inda antes do derradeiro suspiro
quase como num sinal
de grato adeus e não mais voos
[ao menos não com as mesmas asas]
com as mãos trêmulas ainda inconformadas
transborda a tristeza e desconsolo
pelos poros
seu consolo é a singela incerteza
sobre vida e morte
(Ex)pulso
enquanto pulsa
um verso nas veias
pensa ser parte
de algum mundo
personagem do agora
sem mais ensaios
a arte In Loco
expulsa os bichos
num pouco de tudo
dança em desequilíbrio
no palco sem plateia
onde corta impulsos
cortinas teias
tecidas longe
além das vistas
encerram a cena
… e, num piscar de hoje
um silêncio ainda é
seu melhor aplauso
Galeria: Dorothea Tanning,
Josette Garcia: nasceu e vive em Curitiba. Livros publicados: Síntese do Sentir e BiArticular. Participou em várias Antologias e periódicos literários.
Blog: http://www.josettegarcia.net.br/