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6 poemas de Marcelo Labes

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VENTO SUL

de qualquer forma
sul

como promessa de
desengano

melancolia grave
de quando faz frio

trópico de capricórnio
redesenhado na garganta.

(do livro Trapaça– Oito e Meio, 2016)

***

incenso e
fumaça de
cigarro.

a mão,
o braço inteiro
dentro do
ralo

tentando
desentupir
o chuveiro:

aquele cheiro
de restos
de gente

cabelos
pentelhos
e sabonete.

aquele cheiro
que costumam
ter os sábados.

incenso e
fumaça de
cigarro

para abstrair
do ralo
e seus
segredos
sobre a
nossa
humanidade.

***

tenho predileção
pelo enferrujado
do cotidiano:

torres de alta tensão
retroescavadeiras
ferramentas esquecidas
pelos cantos

engolir pregos
e percevejos

tudo teria
começado
numa anemia
infantil

prescrição médica
que recomendava
sulfato ferroso

todos os dias
dois comprimidos
no café da manhã.



é preciso amar com pressa
e viver com calma
ou o contrário
(quem sabe?)

talvez a imagem
não te agrade,
mas enquanto lavava
minhas tripas na pia
junto da louça do
final de semana,
encontrei os tumores
e os traumas
[com sal e limão,
não há melhor
aperitivo].

o que eu queria
mesmo dizer
é que o sol de
segunda cedo
anuncia dias
melhores

ou piores

mas isso dependerá
(como sempre depende)
do lugar ocupas na sala
para ter melhor visão
dos fatos ocorridos.

***

Parado como a fronte do lago
antes que a criança atire a pedra
e forme ondas ondas ondas

Parado completamente parado
como de susto com cachorro brabo
como os doentes em coma

Parado como um porta-retratos
de alguém que já não se lembra
mas ocupa espaço na sala

Parado como as mãos
como a respiração os olhos
como o coração do morto.

***

(inédito)

a planária sim foi feita à imagem
e semelhança do divino:
ignorantes não percebem o sagrado
no platelminto sempre ilustrado
estrábico nos livros didáticos de
biologia: amputado, se regenera
e por isso se multiplica quando
cortado em fatias.
ali verdadeiramente reside deus,
pensei comigo. e se desisto
é pelos anos de pés na água
(onde habitam as planárias)
e os anos dedicados à teologia
que nunca permitiram contato
fosse nos confessionários
nos laboratórios nas 
epifanias.


Galeria: Markus Raetz 

Marcelo Labes nasceu em Blumenau-SC, em 1984. Autor de Falações [EdiFurb, 2008, poemas], Porque sim não é resposta [Antítese, Hemisfério Sul, 2015, poema], O filho da empregada [Antítese, Hemisfério Sul, 2016, poema] e Trapaça [Oito e Meio, 2016, poemas]. Publica no blog http://mmlabes.blogspot.come na página http://facebook.com/matematicaligraficamentira




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