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5 poemas inéditos de Felipe Pauluk

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dez

só hoje é a décima vez
que eu abro o inbox e tento te escrever.
você não sabe o que é tentar
por dez vezes tirar um guindaste
que amassa o peito.
dá canseira,
vou dormir.
boa noite.
amanhã eu tento mais dez vezes. [f.p.]


ppt

depois que você se foi
eu passo os dias tomando café frio
recebendo boletos com teu nome
e assistindo aquele powerpoint motivacional
com fotos do filme "cidade dos anjos",
narração do bial
e trilha sonora de "wind of change",
a porrada foi grande [f.p.]




grifo

o amor
este animal alado, sem calda
com as orelhas cortadas,
tipo um grifo,
que a gente coloca pra lutar nas rinhas da vida
clandestinamente,
se fere, toma uma surra do grifo adversário
que tem pelo malhado
& bojo artificial de hormônio injetado
voltamos pra casa, fumando um cigarro
enquanto a neblina dança
o grifo querido, todo ferido
com um corte profundo na asa esquerda
chorando quieto, miúdo, implorando vida
voltamos pra casa,
"desta vez não dá mais, chefe"
- diz o açougueiro que faz bico de veterinário
"pode sacrificar, então"
o amor, este animal novinho que a gente vê
passando os olhos nas capas da banca de revista
procurando um dono novo
a gente observa da janela de casa.
a gente é meio bobo, pega pra criar,
coloca na luta pra matar. [f.p.]


diário

como uma mariposa semi-morta
que se debate
entre a cortina e o vidro
uma coca-cola sem gás
adocicada com o vento que deita
por cima dos rios mais poluídos
como um dente podre, solto,
engolido e preso na garganta
como um joelho no asfalto quente
enquanto a criança cai
como uma pomba precipitando do fio de alta tensão
estilingada com a pedra afundada no peito
e o sangue lavando as penas

assim

nossos diários mentais sobre o amor
nos golpeiam todo santo dia. [f.p.]


amanhecer

hoje eu amanheci calmo
como um gato sphynx abastecido
vivo como um raio que rasga
o céu & lambe a árvore & tosta seu miolo
pacífico como um bêbado que rumina e baba
na sarjeta após os tropeços noturnos
hoje eu apenas amanheci
e mijei toda minha saudade de você
sou um novo homem, creio em deus,
leio a bíblia antes do café
e pretendo ir a igreja aos domingos
hoje eu amanheci
nem que isto dure até a tua próxima ligação
mas amanheci.


Imagens: Noell S. Oszvald


Felipe Pauluk é um curitibano residente em Londrina, jogou na loteria da vida e, numa quina fodida, tirou o menor prêmio, a literatura. Tentou se enforcar lançando seu primeiro livro, Meu Tempo de Carne e Osso (2011). Depois vieram algumas contas à pagar e saiu Hit The Road, Jack(2012). Em 2015, foi detido nas redondezas da ala mais perigosa da cidade portando Town. De frente com os homens da lei, ele negou, no entanto, foi provado que se tratava de mais um romance. Pauluk coleciona passagens por poesia-breve, fragmentos e roteiros de clipe. em 2016 a vida não foi diferente, ainda dentro do submundo da literatura cumpriu pena pelo lançamento do comida di butequim (2016), um pocket livro de bolso, considerado uma arma branca de lirismo. Está aí o elemento.

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