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Ilustração: “Ouroboros” de Brenda Erickson |
Que teu firme desejo
de fim
me guarde no lastro
do agora
e me reinvente
em meio ao alarme
desta hora
deixe-me pardo
de samba e fa(r)do
inconformado
vermelho barro
Ó puro nado
dá-me o tropeço
de pele e lepra
em que me arrasto
onde envelheço
valha-me a vala
de cada começo
no que invento
ou no que inverto
onde engrandeço
o logos
de minha alma
súbito
surja
a história: do chão
diário e lunar
do rastro e do pejo
onde os homens acham
achas de fogueira
despojos de colheita
e máscaras de cervo
e de achados vão
resvalando a versão
do trigo, do pão
e da prata forjada
nas esteiras
mais que no cimo
insípido
das estrelas
minha cauda não cresça
nem me cegue a carteira
ofereça uma cédula
apenas
ao bêbado
o presente
em sua presença
sabemos
ser dobra
de si mesmo
o objeto:
visa
: o objeto
na matéria
de sua multiplicação
a mão sem reserva
de história
produz para a boca
sem futuro
toda transcendência
resume-se ao espelho
e o mundo refletido
claudica
no intervalo de um débito
ou de uma falta
duplo vazio
do duplo
copo que o devora
desde já
a ciência fala
para ouvir-se
a janela
para a especulação
a fé para a fé
a arte para o gozo
a mente para a tele
patia
a palavra para a auto
telia
(ainda que eu me enrosque
em sua noite)
à roda dos vivos
afaga-lhes
a perífrase
- o que mais cintila
a maçã,
a soberba
ou a sibila?
Ferida no
olho
do imprevisível
é lançamento
do baço
com ou sem causa
relance pálido
deste
ente no charco
do tempo
e
ou
do espaço
onde o sol transita
e (em dias limpos)
nos liga
entre o sobejo
do caos
e a sombra
da casa
círculo:
lagar
onde
resvala
por um momento
o sentido
de estar
ou de teimar
pela construção
do mundo
do qual se carrega
uma
posta
de memória
ou uma pasta
[ magra]
de biografia e poemas
pagos
a crediário
até a
lápide branca
fincada
no perímetro
de si
(onde eu colocaria
quem sabe
um haikai
de Issa)
Em cada
pequenina
circunvolução
de Ouroboros
tentar é começo
não fim
Que a mais bela
revolta
do pensamento
suplante
o umbigo
do meu ínfimo
movimento
− para que este
enfim
não morra
em mim
ANTONIO AÍLTON - maranhense, professor, poeta e ensaísta.Doutorando em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, pesquisador da poesia contemporânea brasileira. Formado em Letras Português/Francês e Mestre em Educação [Cultura e Imaginário na Educação] pela UFMA. Especialista em Crítica da Literatura Contemporânea, pela UEMA.Livros publicados: Compulsão agridoce (Poesia, Paco Editorial, 2015), Os dias perambulados & outros tOrtos girassóis (2008, Prêmio “Cidade do Recife” - Categoria Poesia), As Habitações do Minotauro (2001, Prêmio Cidade de São Luís - Poesia) e Humanologia do eterno empenho: conflito e movimento trágicos em A Travessia do Ródano, de Nauro Machado (ensaio, com o qual recebeu o Prêmio Cidade de São Luís. É editor-colaborador do Suplemento Literário e Cultural JP Guesa Errante, de São Luís do Maranhão. Eleito em dezembro/2016 para a cadeira 22 da Academia Ludovicense de Letras [São Luís-MA], que tem por patrono o poeta Maranhão Sobrinho
ailtonpoiesis@gmail.com
https://antonioailton.wordpress.com