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6 POEMAS DE MARÍLIA MIRANDA LOPES

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Electrifico-me


Electrifico-me
nos passos na curva incerta
Choque entre agulhas – veias –
- caminho de ferro rumo a ti

Estremeço onde o sono me tem
na paragem
da ausência

Depois acordo dentro da vitrine
Século – tentáculo cujas pernas
se lançam para o exterior
em surto de ramos luminosos
onde as aves caem 
electrocutadas

Grito
Eco – sede – ferida
nesse teu voo alucinado

Vens em sonora
água em derrame
sobre o fumo

Voas sobre a fuligem deste tempo
onde te perco.

(in “Castas” – Q de Vien Cadernos de A Porta Verde do Sétimo Andar)



As minhas mãos


Em concha as minhas mãos oferecem
o sabor da titânica

paisagem de ranchos
vindimadores numa estreita

dádiva
água criadora
serros montes encostas vales
terra lavrada

As brancas casarias avistam
o labutar dos membros
os rebanhos a chocalhar
ermas fora

O rio abre um sulco navegante
que se ergue em cachões difíceis
como estes braços

vergastando machos
que equilibram canastros
recalcados de uvas

onde poisam abelhas
pelo melaço.

(in “Castas” – Q de Vien Cadernos de A Porta Verde do Sétimo Andar)



Tequilha


Bebo uma tequilha de Frida
neste dia de finados

O chão treme, a segurança é termos um ninho na árvore
mais recolhida da indústria

Passa um mendigo esfarrapado que pára de cantar

Happy Birhday, fiéis defuntos!
Quero confraternizar com as feridas
Num danzón no salón México!

Anoitece no passeio dos olhos de fumo
Tiro a roupa. espero não regressar à realidade

Aqui morro com marimbas, despida.
Que me lancem, sôfregos versos,
os vagabundos invisíveis de Mictlán.

(inédito -2013)



Amália transversal


Mais aceso é o poema na máquina vocal


A ardente esvoaça no palco, onde resgatamos o instante do destino, em retrato
A fortaleza com que nos amacia entranhas docemente
O som vai crescendo
com o despontar da lágrima contida. já sem palavras. só o timbre

Dentro, uma harmonia triste

Fado da lonjura - nevoeiro dos mortos e dos que ainda respiram faróis - a Saudade - horas sagradas, as da escuta. Amarramos
o horizonte à crença nessa estirpe inatingível. voltará a erguer-se
como a voz, uma vez dormida ou embriagada
poética de projecções

Navia olha por nós, na correnteza das águas. a melodia transborda
a força dos versos na manhã clara

O povo sempre canta.

(inédito – 2013)



Desbravamento


Em cada passagem um desbravamento
mais do que mistério
ou ritual

Em cada transformação um sopro
mais do que passo
mais do que tempo

Que se brinde
ao Desconhecido
que trazemos dentro
que se brinde ao mover dos lábios
rente ao cálice,
revolucionário amor.

(inédito, 2013)



Fumo


Esquece-te de mim
amor que eu quero
só na neblina
só no desfeito 
silêncio da sílaba

Esquece-te de mim
perde de vista
o meu fantasma
na estação Desejo

Esquece-te das mãos, dos gestos
do rosto que nos beijos
te levou sem nada

Esquece-te do nome, da figura
Esquece-te de quem fui 
não sendo em ti
mais do que pó

Assim na carruagem a combustão
golpeará o fim do trajecto
e no céu 
o fumo intenso.

(inédito, 2013)



*    *    *


Marília Miranda Lopes nasceu a 22 de Maio, no Porto. Poetisa, crítica literária, dramaturga e escritora de canções. Formou-se em Línguas e Literaturas Modernas (variante de Estudos Portugueses) pela Faculdade de Letras da Universidade da cidade onde nasceu. É professora de Língua Portuguesa do Ensino Secundário e formadora pelo Conselho Científico -Pedagógico de Formação Contínua nas áreas das Didácticas Específicas e das Oficinas de Escrita – Poesia e Teatro. É autora de canções para a infância que integram vários projectos de animação do livro e da leitura a partir da obra de Aquilino Ribeiro, dos irmãos Grimm e de Alfonso Sastre. Escreveu Poesis em Oásis (poesia, 1994), Framboesas (Teatro, 1996), Geometria (poesia, 1998), O Escudo Invisível (conto da antologia “Histórias Tiradas da Gaveta – edições Tellus); O mais belo segredo do mundo (poema da antologia “Pequeno Cancioneiro de Natal, 2000); Maria da Silva, pastora e rainha (peça representada pela Filandorra- Teatro do Nordeste; 2002) Templo (poesia, colecção Tellus, nº10; 2003); Duendouro – Era uma vez um rio… (Teatro, 2007 - Edições Afrontamento); Aqua (conto incluído na antologia “Pegadas”, editado pela Q de Vien, com autores portugueses e espanhóis); e “Castas” (Poesia, 2012 - edições Q de Vien Cadernos da Porta Verde do Sétimo Andar).
Tem participado activamente em alguns eventos culturais, tais como “Portuguesia; no Festival de Literatura do Algarve, em Filo-cafés promovidos pela Incomunidade e pela Associação Extrapolar e Raias Poéticas (Famalicão, 2012). Tem publicado poesia, prosa poética e recensões, quer no seu blog “Cosmoscripto”, quer em revistas e jornais, entre os quais o “Letras & Letras“ (recensão do livro “Imobilidade Fulminante” de António Ramos Rosa, entre outras publicações) e Triplov.



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