STEFANI, Felipe - Retrato do Poeta Marcelo Ariel ______________________ O QUE É UM POEMA? ______________________ Um poema PODE SER um deslocamento contínuo DA PRESENÇA até PRESENÇAS, obviamente UM POEMA É O OPOSTO DE UMA METAFÍSICA DA PRESENÇA, nenhuma palavra utilizada no tempo linear pode dar conta deste deslocamento, principalmente nenhuma palavra do século XX, este híbrido de movimentos feudais e nazipsíquicos INFILTRADOS na realidade, pré-gravado para a conversão do corpo através dos celulares e o corpo JAMAIS SERÁ UM POEMA como UNIDADE INDIVISÍVEL ou seja como NOSSO, as zonas e circuitos de dissipação-CIDADES criam essa ILUSÃO e MISTIFICAÇÃO, mas ELE pode ser UM POEMA como EXPANSÃO DA ENERGIA para uma sequência infinita E NÔMADE DE METAMORFOSES, se há a indivisibilidade de inúmeras senhas para o movimento similar ao dos drones emocionais, não pode haver o poema, os drones emocionais exigem senhas de pertencimento e NÃO EXISTEM SENHAS PARA O POEMA EXATAMENTE PORQUE ELE É CONTÍNUO, o poema contínuo é A ENERGIA DO ABERTO, capaz de gerar campos de tempos elípticos onde só se movimenta O SER que é ele mesmo uma energia do aberto. OUTRAS TEMPORALIDADES acontecem, mas o poema acontece cada vez mais FORA DA PALAVRA e FORA DA LINGUAGEM, o que tateamos nestas CARCAÇAS PSÍQUICAS é um estilhaço da SEMIPRESENÇA. Uma rosa pegando fogo dentro do gelo e etcétera e etcétera. O que motiva a escrita de seus livros? A doçura do Sol, todos os planetas querem entrar no Sol, cosmoerotismo como o não-lugar, isso é dentro mas lá no espaço, intrigante como a explosão lenta de uma árvore em dez mil anos de ontem, mãos de gelo na chuva, oceanos nômades sem interioridade, isso move as insurreições, em breve. No que você está trabalhando atualmente? Não trabalho! Acontece e saio da frente, pede que se saia da frente, é o atravessamento para a o fora múltiplo, sem nomes, sem nomes, nem países, encontro e diálogo, estes sóis, estas águas, uma amiga me disse que quando tocamos no pó dos cadáveres que foram cremados, ele não é como a areia, há uma porosidade etérea, há algo que está vivo neste pó, algo que pulsa, como um poema, acordando. Como seu trabalho atual irá intervir na sua fala no Seminário? Povoamento de abismos, como cancelar o teatrofantasma, o olhar é como o pólen, flutuante, ver é ouvir e ouvir é ver. * * * Do livro COM O DAIMON NO CONTRAFLUXO (Patuá, 2015) __________________________________________________ RECADO DO ANJO PARA AQUELA QUE SEGURAVA AS FLORES DIANTE DA TROPA __________________________________________________ “ São pouquíssimos os espíritos aos quais é dado descobrir que as coisas e os seres existem.” Simone Weil Podemos ouvir dentro das flores o eco do silêncio dos presos atirados no mar cortando nosso céu o que você agita diante da tropa aparece como estas flores que também são como raios que se misturam com gritos vemos os fios de vozes se misturando com a fumaça das bombas estes que estão no fundo do mar cantam vosso nome Devemos descer na velocidade das trevas dizem para lugar algum a tropa avança diz uma a da criança cancelada por vossas lágrimas na Ágora onde floresce ainda a ideia da aliança entre a exterioridade do espírito e a outra, que chamais de urbana por você, uma vez mais a visitação do Anjo da dignidade humana não, a criança que ordena, nunca ouviu falar nas bombas de mel de Beuys ela não pode ver a luz saindo do fundo do mar da voz dos sem sepultura convertendo a tristeza em coragem O Arcanjo segura nestas mãos que sustentam no ar, as flores como se abençoassem a terra, enquanto você chora, professora, décadas depois Porque todos os tempos são simultâneos , no antissonho, o Anjo mostra ao “governador” agora , apenas uma criança assustada a beleza & nudez da verdade da luz que sai das flores apagando as cidades. _______________________________________________________ Ò SAGARBHA NO CAMINHO DO SABIJA - SAMADHI _______________________________________________________ Lapida o que no nome se cristaliza O_____________ como neblina genealógica, a visão de uma árvore como um recado das Nebulosas Eis o parentesco mais sutil que explica a palavra que costura em nós os mortos, Árvore O efeito é encantatório, Respirar Primeiro êxtase dentro de Outra-Outro Lapida o Rosto do que será este duas metades , Solar-Lunar que Seu nome _________________________________________ Não te fará lembrar |
Marcelo Ariel— Santos, 1968. Livros: Tratado dos Anjos Afogados (Letra Selvagem, 2008), Retornaremos das cinzas para sonhar com o silêncio (Patuá, 2014), Com o Daimon no Contrafluxo (Patuá, 2015), entre outros. Coordena cursos livres de criação literária em Santos-SP e São Paulo-SP. |
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MARCELO ARIEL - 3 POEMAS
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