![]() |
Ilustração: Melissa Maresca |
o visitante
já o inverno me rodeia
tece sua teia branca
finca estaca lá na porta
entra por baixo das telhas
reclama lenha coberta
arranha-me a pele
eu quieta no meu canto
ele insiste pede leite
uma dose de conhaque
chá de cravo de canela
chocolate sopa quente
agasalho meias vela
o inverno veio cedo
com seus braços magricelas
respiração ofegante
pouco cabelo
misérias
lesmisérables
em noites turvas ou frias
pobres corpos se procuram
sob viadutos e marquises
nos redutos dos ratos e das aranhas
os filhos do infortúnio
extrema-unção
se foi para paris
se não me quis
vai ser atroz
não vou atrás
garçon
traz-me um copo de aguarrás
ou um scoth
rimar é ilusão
![]() |
Ilustração: Melissa Maresca |
sílfide
dentro das quatro paredes
inventava ser feliz
escancarava a janela
abria as asas em leque
flutuava
ia a paris
fluidos
tornei-me assim liquefeita
quando daquela feita
despi-me de nãos e sins
de mim então me perdi
nessa vontade inconclusa
acumulada no rim
ficou a mágoa comigo
fincada dentro do umbigo
quase criava raiz
minha tristeza de chuva
esta amargura profusa
tem olhos túmidos
sou tal e qual o dilúvio
derramo transbordo enxurro
sangro os pulsos
paixão
um cão vadio disse ao girassol – vem comigo
vou levar-te ao polo norte onde o sol brilha
seis meses consecutivos
:
morreu de overdose
a pobre flor
LÍRIA PORTO