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Ilustração: deviantART |
“Tout commence par une interruption.”
Paul Valery
Grávida
Se a espera
é o que se faz dela
as espero com a mão na terra
plantando poemas
para germiná-las,
filhas flores.
é o que se faz dela
as espero com a mão na terra
plantando poemas
para germiná-las,
filhas flores.
Desaguo
Duas linhas cor-de-rosa
e outra vez o medo
do sangue
que sempre esteve por vir
e que eu termine
jogando um produto azul
para limpar o vaso.
e outra vez o medo
do sangue
que sempre esteve por vir
e que eu termine
jogando um produto azul
para limpar o vaso.
Duas linhas cor-de-rosa
e outra vez o segredo
de blindar qualquer sorriso
antes do terceiro mês
e a espera eterna
de quem nunca viu
o sol nascer.
Duas linhas cor-de-rosa
e outra vez o silêncio
o luto por ninguém
às vezes tenho vontade
de estar só
às vezes só quero
que tudo não se parta.
e outra vez o segredo
de blindar qualquer sorriso
antes do terceiro mês
e a espera eterna
de quem nunca viu
o sol nascer.
Duas linhas cor-de-rosa
e outra vez o silêncio
o luto por ninguém
às vezes tenho vontade
de estar só
às vezes só quero
que tudo não se parta.
Duas linhas cor-de-rosa
e a leitura do prospecto.
Me canso dessa escritura
sem relato.
É tão longe pedir
tão perto saber que não existe.
e a leitura do prospecto.
Me canso dessa escritura
sem relato.
É tão longe pedir
tão perto saber que não existe.
Fator RH
O fato
é que não morre
mas tampouco nasce
meu feto ficou retido
no departamento de RH.
Conversas que não se editam
As vizinhas na esquina
fofocando outra vez da menina grávida
- outra vez?
e a menina: sim,
mas acho que este tampouco nascerá.
fofocando outra vez da menina grávida
- outra vez?
e a menina: sim,
mas acho que este tampouco nascerá.
Do claustro a pia
Não dá pra por o filho de novo no ventre
Não dá pra por o vômito de novo pra dentro
Não dá pra expor o íntimo e sair isento
Tinha que sair, saiu a tempo:
o filho morto, o gosto fétido, o sentimento.
Não dá pra por o vômito de novo pra dentro
Não dá pra expor o íntimo e sair isento
Tinha que sair, saiu a tempo:
o filho morto, o gosto fétido, o sentimento.
Lugar de espera
Ser mãe
e contar nos dedos
quantos anos faltam
para colocá-los pra fora.
e contar nos dedos
quantos anos faltam
para colocá-los pra fora.
Mas não tenho pressa
tenho tempo
e dentro de mim
todos os filhos do mundo.
tenho tempo
e dentro de mim
todos os filhos do mundo.
Ellen Maria Vasconcellos tem 27 anos, é formada em Letras na USP onde atualmente faz o mestrado em literatura latino-americana contemporânea. Trabalha como revisora, preparadora e tradutora de textos. Já vendeu livros e deu aulas de português e espanhol. Seus poemas já saíram em diversas antologias, as mais recentes são "Anamorfoses" (2014, Annablume) e "Frontera" (2015, Lagrullita Cartonera - Chile). Também já marcou presença nas revistas Zunai, Mallarmargens e na El humo (México). Acredita em fantasmas e desconfia dos vivos. Toma Fanta uva e café sem açúcar. Enxerga muito bem, mas às vezes fecha os olhos. Não tem o coração de pedra. Publica seus textos (e os deles) em http://ritepramim.blogspot.com.