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POEMA DE RICARDO CORREIA

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KLIMT, Gustav – Danaë (1907), oil on canvas.







O Amor Dela Segundo Cabral

(para Anna Apolinário)






Ela amava com a austeridade de um anacoreta.
Como se fora um monge hesicasta.
E embriagava-se de amor
como os padres do deserto
entorpeciam-se de Deus.
Assomada ao cajado de seu amante
como fosse a cítara de Efrém
vibrando entre seus dedos
ao proferir seus apotegmas.

Ela amava como o Himalaia é.
Voando como se fosse Milarepa.
Amando como as máscaras raivosas
dos espíritos tibetanos
povoam o panteão budista de assombros.
Desbravada em suas cavernas
como fosse mantras de Shakiamuni
ecoando nas paredes de sua boceta
ao aquecer suas geleiras.

Ela amava concisa qual um verso taoista.
Qual hexagrama não criado.
Qual se fora poeta haicaiano
que não mais compondo seus haicais
preferisse ser currado por demônios.
Equilibrada em opostos elementos
o yin e yang alternavam-lhe os sentidos
para livrar-lhe das marcas do seu tempo
qual Lao-Tsé penetrando seus vazios.

Ela amava besta qual xamã siberiano.
Tornada bicho em seu errar pelas estepes.
E eriçava os pelos do seu corpo
entoando um canto gutural desvairado
à solidão oceânica de seu horizonte.
Rasgando a carne sofregada entre dentes
fervendo o sangue em seu esgar desvairado
mirava a presa da sua besta entre as pernas
que mastigava entre seus lábios dementes.

Ela amava mais intensamente
que o poderia a racionalidade andaluz de Cabral
fazer conter em copo d'água.
Qual se tornada um Capibaribe, vazasse
toda em poemas que lhe escorressem entre as pernas
em uma enchente de proporções oceânicas.
Ensevilhando os jardins feéricos
pernambucava em redondilhas assimétricas
como soubesse que fragmentada no verso
exuberante fosse experimentar-se em vida.




Brasília, 20.12.2014







Ricardo Correianasceu no Rio de Janeiro em 30 de julho de 1966. Depois de ter vivido grande parte de sua vida em João Pessoa (PB), mudou para Brasília (DF), onde atualmente reside. É membro do Sindescritores (Sindicato dos Escritores do Distrito Federal), da UBE (União Brasileira de Escritores) e da ANE (Associação Nacional de Escritores). Publicou, em 2012, o livro de contos O Colecionador de Vulvas. O Abismo do Sátiroé o seu primeiro livro de poemas.Participou de antologias de contos e poemas. Diz escrever "por não encontrar nada mais interessante para fazer".

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