Quantcast
Channel: mallarmargens
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

7 poemas de Líria Porto

$
0
0
Ilustração: Paul Klee


pálpebras

de manhã abro a janela
e deixo o sol penetrar
no corpo da casa

à noite fecho-a de novo
(estrelas ficam lá fora)
eu durmo dentro
do ovo

na lua cheia
não tenho
regras



coleção

quero espero
flagrar o amanhecer
e num gesto súbito
guardar o lusco-fusco
no bolso

(quem precisar de lilases
de azuis prematuros
tenho infinidades)



arabesca

a lua é a pupila
do olho azul do infinito

desde que o mundo é mundo
ela nos vê a tudo assiste
(o que é feio o que é bonito)
registra os fatos e repassa-os
para o gestor dos destinos

é ele quem faz (in)justiça



à espera dos pirilampos

eu vejo um mar de janelas
e detrás de um tanto delas
olhos acesos

será que alguém me vê
ou se põe a imaginar
que aqui tem gente?

bastava um aceno



roça

noite de céu arado
nenhuma moita de nuvem
nenhum torrão de lua
tão somente estrelas
semeadas



adiamentos

a lua esperava o sol
redonda um talismã
quando ela se despiu
ficou de manhã

o sol lambia a lua
o meio o lado as beiras
lamberia a face oculta
a nuvem veio

só amanhã



insônia

a boca escancarada da noite
os urros do silêncio
as teclas mudas

não tilintam os cristais
não estilhaçam a vidraça
amantes não sussurram
não há sinos de igreja
o mundo acabou
o relógio dorme
o tempo não passa

onde estão os latidos
os galos os gritos
os olhos do sol?

na cama
o corpo exausto
o vazio da tua ausência
e os mil anos desta noite
que nos engole
que nos vomita



Líria Porto - professora, poeta, natural de araguari – mg – autora dos livros borboleta desfolhada de lua, publicados em portugal – 2009 – e garimpo asa de passarinho, publicados no brasil pela editora lê – 2014.




Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548