Ilustração: Michael Cheval
Para plantar lembrança
Não tem mais tic-tac
os relógios correm digitais
até o merthiolate
quando uso não me arde mais
Eu já não ouço o tempo
mas ainda sinto dor
Não tem mais telegrama
sentimento é virtual
e a música baiana
resumiu-se em carnaval
os relógios correm digitais
até o merthiolate
quando uso não me arde mais
Eu já não ouço o tempo
mas ainda sinto dor
Não tem mais telegrama
sentimento é virtual
e a música baiana
resumiu-se em carnaval
Eu já não mando cartas
mas ouço os filhos de Canô
E diante das mudanças – Ando
Diante das andanças – Mudo
Diante das mudanças – Muda
mas ouço os filhos de Canô
E diante das mudanças – Ando
Diante das andanças – Mudo
Diante das mudanças – Muda
Temporão
Num beijo que nem chegou a ser de amor
é onde estou agora
Era terra infértil de novo
e eu ali me semeando
Não sei que doença há nos meus olhos
e nos meus sentidos
Era superficial e fogo
e eu ali me semeando
Trovões e relâmpagos
alertavam da chuva
que não veio
Por que se injetou na dança, nos planos, nas ancas
se não era para durar?
Tudo o que é demais não cabe
e em silêncio recolhi as minhas sobras
Morri semente sonhando com podas
é onde estou agora
Era terra infértil de novo
e eu ali me semeando
Não sei que doença há nos meus olhos
e nos meus sentidos
Era superficial e fogo
e eu ali me semeando
Trovões e relâmpagos
alertavam da chuva
que não veio
Por que se injetou na dança, nos planos, nas ancas
se não era para durar?
Tudo o que é demais não cabe
e em silêncio recolhi as minhas sobras
Morri semente sonhando com podas
Furta-cor
Este é nosso saldo:
um vestido rasgado
promessas de orgasmos
momentos felizes
e o seu dom de cura
aguçando cicatrizes
O muito se instalou em mim.
Axé
Em festas e muros
em gestos e rasos
em rádios
Você me faz doer
até nas coisas por acaso
O volume exagerado
também é nosso retrato
Meu amor, como é que pode?
Nossa história relatada
em desamores de pagodes
Definitivamente não sou eclética a tal ponto.
Rosa Mosqueta
Das coisas que não lembro mais
com precisão
está seu cheiro
Falta de ponteiros
Escassez ou excesso
de desejo
Não sei e tanto faz
Preferiria saber seu cheiro
de cor e salteado
de terno, engravatado
em pele, descabelado
Aquelas promessas ébrias
feitas à beira do amar
Sem rosas
Esperar reconhecer seu cheiro
por acaso, incomoda
E seu almíscar será sempre intocável.
Barbara Leiteé administradora de empresas, produtora cultural, poeta e compositora. Décima esposa de Vinicius de Moraes, dançarina de coreografias estranhas. Participou de diversas antologias antes de publicar seus livros Caramelos e Almofadas -2011 e Esmaltes –nuances do amor demais – 2014, ambos pela Editora Patuá