Ilustração : Don Paulson
Do Tony Villela
Eu que imaginava ter cruzado muito o mar de braçada.
Entre tormentas, ondas gigantes.
Ter bebido muito da água salgada.
Até a cabeça doer pulsante.
E, nos músculos, a dor constante das câimbras.
Para o resgate de todas as penas.
Retornar à condição original da pureza.
Onde a aflição é intangível.
Expande-se minha consciência no voo sublime da gaivota.
Rumo ao sol.
Mas há ainda a preocupação contigo.
Fica tranquila e serena, criatura.
Surfo à superfície das ideias,
tatuando no teu coração os mais belos desejos – delicadas filigranas.
Porque os teus sonhos também são os meus.
Viva com intensidade a dinâmica da Terra – cada revolução.
Encontramo-nos num destes giros das pedras celestes.
No reflexo do sol que vem da lua.
No reflexo da lua que vem do mar.
Mandinga de amor
u m a s e q ü ê n c i a d e l e t r a s e s p a ç a d a s
p e r n a s d e g r i l o s
u n h a s d e l a g a r t i x a s
outodasaspalavrasescritasjuntas
línguasdemorcegos
folhasdaárvorequedámelancias
si-bas-la-em-ra-ba-das-lha
nis-de-pê-for-gas-mi
los-qui-de-sas-de-a-bé-lu-li-las
palavras seguidas
entre linhas trocadas
pra não haver dúvida do fogo brando
levar ao ponto de preparo
num tacho de sal grosso
areado com bronze
fim-en
in-den-pen-te-de-da-fi-di-da-de-de-cul-ten-der-en
p r a s e a m a r i n f i n i t a m e n t e
nãoháreceitamelhor
que-ma-u-a-bo-do-se-de
c o m p r e e n s ã o e c a r i n h o
O sol que invade o teu quarto
Se Você descobrir que o mundo é mais bonito aí da tua janela,
me chama para eu ver também.
Compartilha comigo da descoberta.
Conta-me cada um dos teus segredos.
O número das estrelas no céu.
Quantas gotas d’água cabem numa nuvem.
Fala do encanto das fadas que habitam os teus sonhos.
Eu acredito na música dos duendes que Você ouve de vez em quando.
E tenho medo dos mesmos monstros que te apavoram.
Muita vez eu fujo e me escondo deles.
Mas apesar destas minhas fraquezas;
das tuas razões para sorrir,
deixa-me ser apenas uma delas.
Apelo
Quando eu gritar
com toda a sonoridade
de uma borboleta
será que Você vai me ouvir?
Se não tendo asas,
meu voo é tão rente ao solo,
imperceptível aos olhos,
será que Você também não o vê?
Das profundezas do mar
minhas guelras permitem
salgar a ausência
do oxigênio que Você respira.
Porque pouco me importa
quem Você pensa que sou.
O coração vermelho irradia,
transborda e envolve.
Mas se do canto dos olhos
uma lágrima me corre,
é por Você.
Manhã de dois olhos
As ideias,
como os cometas,
viajam em lampejo
de um único instante.
Captado o exato momento:
brilho raro
ou rebento – de luz.
Mas se perdido da visão,
arco-íris de pensamento.
Manhã de dois olhos,
assim como as ondas suaves
de um mar caribenho.
Meu coração em aperto.
Sigo sempre sozinho.
A espera do transporte
o mais simples
remete ao mais profundo dos signos
desejo que traz consigo a saudade
das tardes quentes de suor
tua cor é minha preferida
vê aquela estrela no céu?
a gente vai se mudar para lá
onde posso sentir eterno o teu perfume intenso
beijar a tua boca vermelha
agora repousa tranquila com os Anjos
eu aqui a fumar-te
inteira em minha mente
Os poemas selecionados são do livro “As Cinquenta Primeiras Criaturas” recém-disponibilizado na íntegra em formato digital pdf para o download, aqui:http://jorgexerxes.wordpress.com/2014/03/14/as-50-primeiras-criaturas-free-pdf-download/
Jorge Xerxes– heterônimo de Alessandro Teixeira Neto – é pisciano; nascido no ano de 1971. Natural de São João da Boa Vista, SP; “cresci ao pé da serra da Mantiqueira; por entre trilhas e cachoeiras; sempre em rota de colisão àquele verde inconcebível”. Estudou por pouco mais de dez anos na Unicamp; “tinha o meu próprio ritmo de assimilar as coisas” diz com um sorriso enigmático no canto da boca. Interessa-se por tudo aquilo que nos passa desapercebido; “gosto de escrever sobre as coisas pequenas”. Mantém o blog “Palavras Órfãs de Poesia: O que Restou” desde Dezembro de 2008 http://jorgexerxes.wordpress.com/ Publicou: “As Cinquenta Primeiras Criaturas”, Livro de Contos e Poesias, Editora Multifoco (2010); “Para Pescar a Lua”, Livro de Contos e Poesias, Ryoki Inoue Produções, (2011); “Trama e Urdidura”; Livro de Contos, Crônicas e Poesias; Scortecci Editora;(2012).