Vidamorte
O corpo estava estendido. Exposto. Morto.
Disposto aos olhos inquietos.
Estava feia. Inchada.
Dissera que como a morte um dia chegaria, que lhe roubasse seu coração.
“Nada mais digno do que morrer de infarto.”
Estava feia. Cabelos curtos e maltratados. Olhos opacos. Sem cor.
Gorda? “Não, inchada.” Estranha.
O pior nunca foi a morte. O pior ainda estaria por vir quando começassem a seguir, erguido, numa espécie avessa de contemplação, o corpó.
Ou, então, quando ele servisse à natureza.
Quando estivesse preso. Na cadeia. E fosse o alimento. Dos bichos.
Estaria, portanto, morta.
E ainda assim o desespero era referente a essas horas de intermináveis olhos vendo sua vidamorte.
Após a travessia, foram jogadas várias flores,
de várias espécies e belezas.
Jogaram, também, terra batida e restos de chão, que, somados aos restos de vida compartilhada pelo barro, visavam entupir o buraco ali exposto.
(...)
Assim pareceu-lhe a vida. Às vezes.
Não sentiu dor no coração.
Pensou, ao contrario, que contradizendo a expectativa, ele foi o último sobrevivente.
Morreu asfixiada.
Tanto pelas flores como pelos barros.
Morreu sobrecarregada pelo outro.