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Kamil Vojnar |
LÉXICO
adie o dia de ódio
adie até o dia
em que a palavra ódio
não esteja no dicionário
não encontre sinônimo
em ira gana raiva rancor
e a razão de ter existido
é a de um dia ter sido
antônimo esquecido
de afeto ternura amor
JORNADA
existe um deserto
para atravessar
um deserto
sem fim
este deserto
dentro de mim
ALMA
ainda que o corpo
deixe de sê-lo
ainda que o corpo
dissolva
sou alma
não sou degelo
ESTUDO PARA UM EPITÁFIO
na hora da minha morte
derramem lágrimas, caso queiram
caso não, sorriam de algum caso
que fiz ou deixei de fazer
que fez sorrir que fez chorar
rezem uma ave-maria
ou deixem pra lá
a vida é uma oração insubordinada
OBRA
o poema não é feito
de argamassa aço cimento
o poema é feito
de vórtice caos tormento
o poema não é feito
de óxido dióxido fermento
o poema é feito
de firula dança pouco de vento
o poema não é... caso desfeito
brotam carne osso sentimento
MEUS AMIGOS MAIS EU
meus amigos mais eu
vivemos na escuridão
não somos convidados
para visitar castelos
somos odiados
por comer com as mãos
mal sabem que
meus amigos mais eu
estamos nesse negócio de verso
responsável por toda energia bruta
que molda cada treco do universo
Os poemas fazem parte do livro As coisas de João Floresa ser lançado pela Editora Patuá.
Marco Aurélio Cremasconasceu em Guaraci, interior do Paraná. É professor titular em engenheira química na Unicamp, Campinas, onde reside. Foi um dos fundadores e coeditores da Babel, Revista de Poesia, Tradução e Crítica. Cremasco traduziu poemas de Langston Hughes, Robert Lowell, Enrique Lihn, Mario Benedettie Oscar Wilde. Tem poemas publicados em antologias, ressaltando os contidos nas coletâneas Passagens, Antologia de Poetas Contemporâneos do Paraná(Imprensa Oficial do Paraná, Curitiba, 2002), Moradas de Orfeu(Letras Contemporâneas, Florianópolis, 2011), nas antologias digitais Vinagre - uma antologia dos poetas neobarrocose Pi², nas revistas eletrônicas Germina Literatura, O Bule, Revista Biografiae nas revistas impressas Babel Poética e Ciência & Cultura. Obteve prêmios em concursos de poesia, tais como o Femup(Paranavaí - PR), Escriba(Piracicaba - SP), Mário Quintana(Porto Alegre - RS), Raimundo Correa(Rio de Janeiro – RJ) e Universitário de Poesia(Antofagasta - Chile). Em 1997 publicou a coletânea de poemasA criação,fruto do Prêmio Xerox/Livro Aberto. Foi o vencedor do primeiro Prêmio Sesc de Literatura, em 2003, com o romance Santo Reis da Luz Divina, publicado em 2004 e finalista do Prêmio Jabutiem 2005. Além dos livrosA criação(Cone Sul, São Paulo, 1997) e Santo Reis da Luz Divina(Editora Record, Rio de Janeiro, 2004), Cremasco tem publicado os livros de poemas Vampisales(Editora da Universidade Estadual de Maringá, 1984), Viola caipira(edição do autor, Campinas, 1995), fromIndiana(em inglês, edição do autor, West Lafayette, EUA, 2000) e o livro de contos Histórias prováveis(Editora Record, Rio de Janeiro, 2007). Em 2010 foi contemplado com a Bolsa Funarte de Criação Literáriapara a escrita do romance Evangelho do Guayrá.