Pas de deux
Luciana Salum
“Pode confiar em mim”
Ouvia quando hesitava em lançar-me ao seus braços durante o pas de deux.
Recurso tanto mofado como bolorento em crer-me absoluta.
Minha dificuldade em contar com o outro estava desmascarada. Pesadelos me invadiam que caia de cabeça ao acreditar que não haveria equívoco em nossa linguagem corporal. Mal sabia, ainda, que basta estar sozinha para desaprender a tropeçar.
(Sim, eu danço. Momento quase-único que tenho tamanha intimidade com meu corpo que consigo ter-me sem carregar-me comigo).
Ele insiste:
“Vem? Eu te seguro.”
Não há garantias.
Eu vou
e caio.
Caio com frequência. Caio de uma altura de impossível captura. Ele segura e mesmo assim eu caio. Ralo-me junto a esperança de uma altura comum, de uma força compactuada e conhecida ao menos aos pares. Ao menos àqueles que dançam a mesma música numa leveza que me ensina que nem tudo que é intenso deveria ser pesado.
Embora admire os solos, não há nada mais lindo que o pas de deux.
Outra vez os olhos.
Eles fisgam-me no raro despertado pelo belo de um encontro.