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MARIEL REIS SOBRE BRAGA TEPI

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ânsia



Braga Tepi*

 

‘O artista, reservado, não é dado as conversas muito alongadas, preferindo a contemplação de suas construções. Se Braga Tepi atribui sua influência aos quadrinhos, sendo mesmo autor neste gênero, prefiro discordar, vendo nele um prosélito de filmografias como Blade Runner, filme americano, de 1982, que narra a saga de replicantes e humanos em uma terra devastada’


O imaginário de ficção científica norteia o avanço da humanidade. Julio Verne, escritor inglês, antecipou invenções através de descrições incríveis das máquinas existentes em sua obra. Em Vinte Mil LéguasSubmarinas, de 1870, por exemplo, Nautilus é um submarino que supera tudo o que se imagina em engenharia naval: o corpo perfeitamente aerodinâmico, com 70 metros de comprimento, oito metros de diâmetro e deslocava oito toneladas.

            A notícia do primeiro submarino é datada de 1776, construído por David Bushnell, chamado American Turtle. Suas dimensões eram pequenas, movido pela força braçal da tripulação, participou da Guerra de Independência dos Estados Unidos. Também não podemos ignorar que durante o Renascimento Leonardo da Vinci projetou vários modelos de submarinos que nunca chegaram a ser construídos e o holandês Cornelis van Drebel cruzou o rio Tamisa, em Londres, em um veículo capaz de operar debaixo d’água. Se Júlio Verne não criou o submarino, se Leonardo da Vinci o projetou em plena Renascença, David Bushnell e Cornelis Drebel se ocuparam em dar forma a este sonho. Podemos considerar que as especulações tanto de Verne quanto os desenhos de da Vinci contribuíram para o aperfeiçoamento desta maravilhosa máquina.

            A ficção cientifica ultrapassou os limites dos livros, integrando-se a revolução do cinema. O primeiro filme deste gênero é “Le Voyage Dans La Lune”, de 1902, com duração de quatorze minutos, porque no inicio do século os filmes não duravam mais que dois minutos, isto já era em si uma revolução. Georges Mélies, autor da película, baseou-se em romance de Julio Verne. O filme narra uma viagem à lua e tem como principal personagem o Professor Barbenfouillis. O nome sugestivo e curioso da personagem contém – Fou – que significa louco em francês e - ill – significando doente nesta mesma língua.

            Toda esta introdução para abordar o universo insólito da arte de Braga Tepi, escultor piauiense, que expõe suas obras na Galeria Hélio Rocha, no Rio de Janeiro. A ficção cientifica é determinante quando detemos o olhar sobre suas esculturas. O artista ressalta que há nele influência dos quadrinhos, comenta sua predileção por Flash Gordon. Executa suas obras que combinam peças de maquinaria mecânica imprestáveis em linguagem refinada, com senso de proporção invejável e capacidade de bricolagem surpreendente, para um jovem com apenas trinta e sete anos.

            O artista, reservado, não é dado as conversas muito alongadas, preferindo a contemplação de suas construções. Se Braga Tepi atribui sua influência aos quadrinhos, sendo mesmo autor neste gênero, prefiro discordar, vendo nele um prosélito de filmografias como Blade Runner, filme americano, de 1982, que narra a saga de replicantes e humanos em uma terra devastada.

            É esta a minha impressão quando me deparo com suas criações. Despregadas de seus suportes, irão falar comigo, cobrar sua cota de humanidade. Se antes o Criador soprava-lhes o barro, considerando a nossa queda, estamos na Era do Ferro. Não podemos ignorar o tipo de homem que caminha sobre a Terra, nem quais as suas angústias.

As linhas das esculturas possuem elegância, o apuro clássico acompanha-o, mostrando que não é um novato ou um aventureiro. Ressaltamos o incômodo com a pátina de alguns rostos que tornam caricaturais determinadas peças, preferindo as soluções presentes nas obras “O Pensador” e “O Homem e o Aro”.

Isto é uma restrição mínima, que poderia ser tomada por capricho de um observador. Não retira os méritos das outras esculturas, apenas se refere ao acabamento. Para as duas esculturas citadas se buscássemos um parentesco, poderíamos uni-las em grau de paridade a outro escultor da Idade do Ferro, Francisco Stockinger, isto porque somos capazes apenas de assimilação por comparação. Talvez um defeito formativo.

            Não concordamos também com o tratamento que o artista recebeu da revista Veja Rio.

Braga Tepi é um escultor ou um artista plástico ou o que seja nessa família.  Se o curso no Senai lhe possibilitou as ferramentas para execução de sua arte, como a utilizada para sua sobrevivência, isto não diz respeito ao criador ecologicamente correto e genial que ele é.

A assessoria de imprensa de Braga Tepi não vê artistas como Amílcar de Castro ou Franz Weissmann chamados de metalúrgicos, ou serralheiros, ou qualquer outra denominação desta natureza. Menosprezo este tratamento.  Braga Tepi é um artista plástico talentoso, antenado com as exigências ecológicas atuais, reinventando o homem ao seu modo. Basta dizer: original.

*Texto escrito em 03/03/2010


andarilho

guerreiro

observador do futuro

unidade perdida



Surrealismo tardio e a obra de Braga Tepi**

 

‘O rosto vazado para que enxergue a si próprio quando contemplado, com seu oco abissal não detona em nós a inquietação que outrora sobressaltava os freqüentadores dos salões surrealistas. Talvez porque, na época deles, existissem sonhos e posições políticas pelas quais cada homem teria de se decidir’

 

Com o entusiasmo arrefecido, observamos que há uma nota de um surrealismo tardio nas esculturas de Braga Tepi. A obra “O Visionário” é um exemplo de diálogo com esta corrente, sua imagética não me parece original, gasta com as repetições freqüentes executadas por Salvador Dali. Não apresenta o resultado que deveria no espectador, não transmite angústia ou a asfixia por não ter livres os membros para reagir contra a realidade invasora.

O rosto vazado para que enxergue a si próprio quando contemplado, com seu oco abissal não detona em nós a inquietação que outrora sobressaltava os frequentadores dos salões surrealistas. Talvez porque, na época deles, existissem sonhos e posições políticas pelas quais cada homem teria de se decidir. Agora vivemos essa dissimulação consumista embalada por ideologias passageiras veiculadas pela mídia, tornando-nos seguidores de causas temporárias, escravos de plataformas políticas provisórias de ação social ou econômica.

A peça “Andarilho” é notadamente a mais indicativa desta presença, porque podemos compará-la estruturalmente com a escultura Vênus Atravessada Por Gavetas. Enquanto que esta é sinalizada pelas gavetas, aludindo ao mistério do inconsciente, aos alçapões onde estaria repousando a verdade humana, Braga Tepi substitui as gavetas por engrenagens que significam a mesma coisa. Nisto percebemos que o artista não consegue superar o modelo adotado como parâmetro – talvez Salvador Dali – se é o caso de uma intertextualidade. Não há força (transvaloração) na confecção das obras, nem a ironia própria das desconstruções.


**Texto escrito em 04/03/2010



o visionário



o visionário II



síntese dos sentidos




Imagens: arte de Braga Tepi



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Mariel Reis (Rio de Janeiro, 1976) é originário do limítrofe bairro carioca da Pavuna (vizinho à baixada fluminense), graduou-se em letras pela UERJ e integrou os conselhos editoriais das Revistas Confraria do Vento e Paralelos. Seus livros lançados são "Linha de recuo e outras estórias" (2005), "John Fante trabalha no Esquimó" (2008), "Cosmorama" (Poesia, 2009) e "Vida cachorra" (2011), este último com prefácio de João Anzanello Carrascoza e quarta capa de Paulo Lins.  Em 2012 lançou "A arte de afinar o silêncio" (leia aqui uma resenha);E-mail.






Braga Tepi, Francisco de oliveira Braga, nasceu no dia 22/06/72. Reside em Teresina desde 1978, onde estudou e desenvolveu uma devoção pelo prazer de fazer esculturas apartir de aglomerados industriais. Saiba mais sobre o artista aqui e aqui.





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