Elos
Uma casa que não se materializa
Zelo e desespero na escada
Na entrada submersa muita gente de fora
No luto o refresco.
Com sombras e deuses latindo.
De onde possa ver melhor o amor.
Divisão e euforia.
Fora da zona de conforto.
Conforto = abraço.
Desmonta (mãos nos cabelos).
A cada passo intenta e é intensa.
* * *
Vento de tulipas
Teia que tatua brindes antes de recolhê-los à porta do sol,
coagula pensamentos.
Brinca na chegada do algodão. Vê amora, peixe
no provérbio do instante ama.
Antevê sussurros nos murais da cidade
Servidora de palavras múltiplas
- ligada ao estrangeiro pela língua áspera -
não equivale pois jorra de si a quilates
* * *
Minha cabeça suspeita
O vento aborda minha pele.
Cercam-me os pombos.
Homens fumam maconha e devaneiam meu corpo.
Aprecio corpos na praia querendo sexo dentro de casa.
Ontem um cara me chamou, passei a tarde com minha filha.
Boicote ou prioridade?
Descubro a pressa das palavras no desenho das tintas.
Pelo menos avanço:
Tento envelhecer sem constipar os sentidos.
* * *
Espelho
Os cílios baixam a vista
A pinça arrisca o olhar.
Retorna,
se lembra do vento em Avignon
- quando tudo que a ameaçava
era real,
não simbólico,
Como a boca rachada
que por vezes ainda arde.
* * *
para Jean-Michel Basquiat
às vezes atino
pincelar o papel
haveria retoques à vida?
um campo - leia-se
cidade em que
alguns (os meus?)
pés timbrem
fixem? Grafite
se eu escrever por cima das palavras
terei borrões
meus desenhos
tramam letras
- luto para descuidar do papel
* * *
se você existe feto
seu tempo não coincide
ao de seus pais
órbita que gira
é a órbita deles
que está deslocada
o seu tempo dentro da
barriga, não é o tempo
claro de te imaginar
latente. Se foi a vulva
a Criteriosa, parte contra parte
carne dentro do sistema
hormônios tresloucados
dúvidas, desesperos
e o insano desejo
de ter você, a qualquer custo
você, o Grande Mutação
protegido está na capa imune?
a toda palavra crua
a todos os testes
espelhos, sondas?
imagem: Flexible, de Jean-Michel Basquiat
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Nora por Fabricio Menicucci |
Nora Fortunato nasceu em Jundiaí, SP, em 1975. É violoncelista. Tem poemas publicados na revista Inimigo Rumor, 18 e 19. Prepara seu primeiro livro de poemas. Mantém o blog "norafortunato.blogspot".