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Dez poemas de Dora Manuel Culabo

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vento aprazível 

Sinto o longe a distância
mão distante instalada de perto
posse  próxima que mescla
o nada que incide tudo 
ausência nitidez
onde nuvem no silêncio 
Sinto ainda
questão ambígua do vento aprazível
Soprar norte-sul, este- oeste
corpo tangente melífluo pesaroso
mel mélico
ou tâmara
vento soprar sul a corpo
respirar suor do gozo glacial
gelo que derrete vagaroso e continuo
sentir chamas do oeste
soprar ainda corpo suavemente a este
sentir ainda e mais
corpo moldado a pingos e pingos de prazer
horizontal e vertical agudo
este ou este que o norte sutra nutra 
sente-se ainda
o perto do distante em mim
o longe
o presente.



objecção

nada 
derrete
meu aço
apenas
teu fogo
é escasso
teu ego
me afoga
em teu rio brio
ébrio corpo e rio 
um eco ecoa
naquelas danças
 satânicas
com
mecânica
e
sensatez
onde
minha alma
nua
é  tua
nua
lua
na dança
finita




enunciação sobre fio-de-sangue  

disse:
escreva um livro
um livro que vague no teu corpo
e que a seguir te toque!
toque-te com palavras
assim como convocas a boca
ao meu corpo soberbo
dir-te-á como saciares-te de amor
onde a distante
desce
desce pelo cordão umbilical a fio-de-prumo
com uma gota de chuva perdida do teu corpo
aquele que faz a unção de nossa carne e alma
disse
escreva um livro
que vagara na tua alma
dilacerada com calma desta unção na alma
como um rio inúmero convergindo em nós.


 



lembretes de um vazio

não é apenas um vazio
que suspira 
respira
transpira voz
talvez ultrajar sem voz
o promissor
vexar sem impropérios
uma sensação de saudade 
banhar a torneira o corpo
a mão palma que almejo
a machado sangrar lábios carnudos
em tâmaras língua sulcada
olha a ângulo o triângulo
que mede cento e oitenta graus
a saudades em lágrimas de sangue
que choram de prazer paredes
que raspam doçura visceral
volúpia do escuro e do silêncio que temo amo





carvão de fogo

cabana frágil
coração fatal
coração letal
cabana que arde  lágrimas e fogo
chora ardência feroz da dor
cabana frágil
que grita coração
a sangrar lágrima de chama
onde corpo em chamas derrete
coração  em chamas
lágrimas e chamas
cabana frágil arde tanto e não respira
convulsiona dor e morre
enfim,
carvão de fogo vira cinza e vive





perdidos decessos 

o soldado marcha vai e vem para a batalha final
o corpo do cérebro últimos miolos peneira penetra
com armas brancas
movimentos circular vertigem
enterrados em banho salgado
suor que corpo transpira corpóreo
soldado vai marchando… e marcha e marcha e marcha sem parar
soldado marcha vai e vem que dispara rapidamente alvo
soldado sente vertigem e cai na vagem
desenterra-se  do cérebro…
acorda morte a vida





emergir

ainda me lembro
de cada detalhe das curvas da tua boca
quando teus lábios cantavam só poesia
lembro como gostava que o grito da tua voz para o papel
fosse um grito da tua voz para meu corpo
de como gostava que fosse o papel em tuas mãos
e sentir a melodia da poesia descer sobre meu corpo
ainda me lembro…
das tuas palavras a fogo
daquele olhar que insistia ser meu
de como era a vertigem do pássaro de fogo
a descansar no teu corpo meu cansaço
ainda me lembro…
do teu leito
sentir o lento batimento do meu peito
sentir ainda a vertigem
que vaga no corpo exposto pelo silêncio
na sombra do corpo coberto 






música obscura 

lenda alma sem alimentação
canta dor e pecado mortal que usa o prazer
sem querer ter almas em juízos finais
rebento a tumba
e canto vitória das almas e gritos suaves
sem querer dor olho os cortes e cicatrizes
daquele corpo que vaga na água sem barco
águas quentes saltam do corpo tangente
para o silêncio corpo cotangente
corpo molhado de sangue e carne na alma
águas com barco e sem gente
bárbaros e amados
amadas e idolatradas
insatisfação e ódio





metade do meu corpo não me pertence

linguagem voz
minha boca sonha beijos molhados
sempre foz
meus olhos fechados gravam sonhos
rio aberto
teu sono pouco tranquilo
lutas amargas
rio língua
corpo imóvel
sonolência brutal
corpo soberbo
teu corpo
teu corpo coberto
não olha somente
olham o infinito do meu corpo
assombreado na volúpia do teu olhar






som do tácito

fogo tem
ninguém vê
sentir a vagem
sem saber de onde vem
cor, rosa-escuro
som em pau-preto talhado
e alma ama mar e amor
e palma da mão sobre a vagem
imigra vertigem
e não finge, atinge
voz foz afia lâmina
lâmina corta
a fogo pela raiz
olhos sentem doçuras a suor
olhos choram
mão engolida pela vagem inteira
corpo grita alma grita
carne grita voz grita
vagem grita- rosa-escuro
dentro de mim outra vida é lambida



Dora Manuel Culabo é professora de Língua Inglês, Poeta Moçambicana. Natural de Niassa, Cidade de Lichinga. Membro do Clube de Escritores, Poetas e Amigos de Niassa – CEPAN. Actualmente reside na Cidade de Nampula. 

doramanuelculabo19@gmail.com  




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