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seis poemas em sintonia, de Carlos Frazão

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Fonte: zarzascrappers.blogspot.com.br






BREVE

Cito Borges: "E seremos sempre breves para sermos."
Houve uma hora. Seria o lugar da desatenção. Alucinado no assalto da luz filtrada pelos veios materiais do silêncio. Um corpo que sonha pousado na penumbra.
Como a linha na margem, 
 aquele dia para viver de encontro às sensações sob o halo das lâmpadas. Não sei. Como se as palavras se esgotassem na nebulosa de um céu de cinza. Digo, de um modo similar ao vento, tudo vai diluir-se no lastro das sombras digitais. Seremos um reflexo da noite, eis uma
citação próxima a cumprir sem obrigação.








A NOITE CUMPRIDA

Vieste de vestido rasgado de um crime,
como se quisesses pintar ainda um quadro inacabado de Edward Hopper,
um poema inútil de um escritor mórbido e desconhecido do grande público. E a noite prestava-se a lugares comuns, junto aos grandes lagos alguém morre de tédio.
Sabias que a existência seria, seria breve e eu queria mais que a tua sombra deitada
neste leito áspero de folhas.








FOLHAS PARA ESCREVER

Uma teoria perfeita e nenhuma palavra. 
Sugeriste algumas que ouviste cantar aos alcoólicos do metro, eu recordei os decadentistas e mesmo os sufocados náufragos.
Uma filosofia absoluta e nenhum postulado válido para viver esta dor
quotidiana – insisto, no espaço do quarto mergulhado por luzes feéricas de anúncios tristes e profundos. Desço as cortinas e tudo se transforma em sombras
coadas, mesmo o teu corpo pousado no vácuo.
A palavra penumbra cumprida na brevidade.








FILOSOFIA ABSOLUTA

Preferes Munch, eu sempre gostei da filosofia para despertar
a inquietação, nos teus braços a vida passa entre árvores, um jardim
está suspenso mais além dos vidros. Acreditar em teoremas, uma fenomenologia
do instante merece explicar o absurdo de qualquer grito de uma pátria de gelo.
Discutíamos o significado de brindar a este destino impossível.
Num caderno de apontamentos folheio o meu registo criminal,
admiro o teu vestido rasgado, talvez tocássemos os ombros na apoteose lasciva
de um eventual vício grandioso.








UM INSTANTE

O que dura é o instante, escrevi no passado, sentindo cada frase escorrer como
um líquido. Os espelhos das cidades anónimas multiplicam a melancolia
pelo deserto dos parques longínquos. Os candeeiros erguidos estendem-se
em luzes amarelas até todos os lugares invisíveis.
O penúltimo argumento para sermos cúmplices.








CONCLUSÃO

Os lugares cúmplices.
Último argumento para sermos invisíveis,
personagens ficcionadas na inquietação.








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Carlos Frazão, natural do Porto, Portugal. Mestre em Filosofia, exerce a profissão docente. Publicou alguns livros de poesia e filosofia. Participa em várias revistas literárias. Espera continuar a progredir neste sentido.


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