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Um poema inédito de Marcelo Ariel

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Cosmograma 8


Eles eram como nuvens
de sangue
dentro do sonho
Havia uma tela no início
e ele estava perto de desertar
do sonho para o infinito efêmero
das imagens fixas
que escondiam algo
ele havia sonhado
que era uma bala perdida
e acertaria seu próprio coração
dez anos depois
como num conto
argentino
ou tcheco
havia um padrão
dentro do sonho
criado pela impossibilidade
de ver a si mesmo
ele era
como um pássaro
transparente
voando
na direção
de um céu
de carne
com ossos
no lugar
de estrelas
a bala havia
perfurado
seu tórax
ele ouviu
o enfermeiro
cantar
essa ária
para o médico
de plantão
na medida
em que a morte
se aproximava
ele ia se esquecendo
do seu próprio nome
e desertando de dentro
do sonho
o fundo branco
das paredes
mudava
para prateado
de acordo
com a intensidade
do som
de um oceano
cada vez mais perto
perfurando seu pulmão
ele ouviu sua voz
misturada
com a voz de
seu avô
dizer a fumaça 
oceânica
haviam
duas águas-vivas
grudadas nos seus braços
e uma arraia
no teto
flutuando
por cima
de seu corpo
dela
saiam
orquídeas
vermelhas
que ficavam
paradas no ar
estas flores
são o tempo
ele se ouviu dizer
e depois
acordou novamente 
dentro da água.

Marcelo Ariel do livro inédito Cosmogramática.







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