não fosse isso / era menos
não fosse tanto / era quase
Paulo Leminski
PÔQUER
Minha esposa ameaçou abandonar-me caso eu não deixe a jogatina.
Vou pagar pra ver.
NO VELÓRIO
- Era um homem honesto.
- Trabalhador.
- Bom pai.
- Bom marido.
Droga, acho que estou no velório errado.
PESO
Sempre foi um peso pra família, pensou o homem enquanto ajudava a carregar o caixão.
MARCAS
Quando era bebê se parecia com o pai.
E agora quando bebe também.
A CURA
Só há um remédio para a minha dor, pensou ela.
E depois tomou todos os remédios que encontrou.
CAUSA MORTIS
Era ótimo nadador.
Porém, alcoólatra, não evitou afogar-se no próprio vômito.
O CAMINHO
Achei o caminho quando perdi o meu rumo.
NO HOSPITAL
Depois de ser mal atendido no hospital, ele foi para um lugar melhor.
D.N.A
Descobriu que seu pai era seu avô.
Por parte de mãe.
VIÚVO
Não perdia a mania de colocar dois pratos na mesa.
ENTERRO
Foi a primeira vez que ele comprou flores para a esposa.
BRANCO DE ESCRITOR
Diante da incapacidade de tornar-se escritor, resolveu matar-se.
Merda.
Deu branco na hora de escrever sua carta de suicida.
NIILISMO
Os monstros japoneses destruindo o mundo finalmente.
E o filhodaputa do ultraman sai lá da galáxia m-78 e vem se meter onde não foi chamado.
AS HORAS
Cortou os pulsos e sangrou feito um porco numa banheira.
Na cabeceira da cama, apenas um bilhete : em branco.
ÁLBUM DE CASAMENTO
A felicidade ficou presa em algum lugar daquela foto.
FICÇÃO
- Cara , você não existe.
- Bondade a sua. É você que não existe.
A ESCRITORA
A escritora arrumou as malas e saiu de casa sem olhar pra trás.
Ali terminava mais uma estória.
EPÍLOGO
Mais uma vez o cigarro venceu , disse o rapaz jogando as cinzas de sua mãe ao mar.
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Bruno Duarte, nascido em 1979 na cidade de Mairiporã, é escritor minimalista. Os pequenos textos acima serão publicados num livro em breve. E-mail - brunoduarte1313@hotmail.com