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7 poemas de Tereza Du'Zai

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Plágio

Vamos imitar os machistas do mundo,
Ignorar seus desejos,
Presenteá-los para seduzi-los,
Comê-los quando e como quisermos,
Estuprá-los caso “mereçam”,
Matá-los se atrevidos,
Explorá-los se submissos,
Empregá-los se assediáveis,
Desempregá-los se envelhecidos,
Difamá-los se orgulhosos,
Amaldiçoá-los se superiores.
Vamos priorizar nossos orgasmos, multiplicar nossos pares.
Sejamos insaciáveis, promíscuas, mentirosas, vulgares.
Ei, gostoso, que tal um filminho lá em casa hoje?



Os Meus Ninguéns

Os meus ninguéns não são os ninguéns de Eduardo Galeano;
Os meus ninguéns, também filhos de ninguéns, pensam que são donos de tudo;
Os meus ninguéns vivem a vida explorando alguéns;
Os meus ninguéns, pouco são, embora acreditem muito ser;
A maioria dos meus ninguéns desconhece a própria língua, mas propaga estrangeirismos;
Muitos dos meus ninguéns são religiosos e supersticiosos; 
Vislumbrados e insensíveis, compram excentricidades por obra de arte,
Gastam exorbitâncias em shoppings centers
E pechincham artesanatos à beira-mar.
Os meus ninguéns não são humanos, mas aberrações humanas;
Desconhecem o significado de cultura, desprezam o folclore, mas se julgam cultos sobre todos os alguéns,
Eles não têm feições, têm maquiagens e plásticas;
Eles não conversam, encenam;
Eles não têm identidade, têm aparências;
Eles aparecem nas colunas sociais,
Mas valem menos do que a vaidade que os mata.




Poemas

Não gosto de poemas de amor, nunca gostei.
Poemas devem ferir, excitar, provocar fugas, mudança de página;
Poemas devem ser escritos não para serem lidos, ou suportados, até o final,
Mas para serem sentidos, admirados ou repudiados, desde o início.
Gosto de poemas hemorrágicos, catastróficos, assassinos, incendiários;
Gosto de poemas malcheirosos, estúpidos, invasivos;
Aqueles que denunciam, provocam, ofendem;
Aqueles que desenterram cadáveres esquecidos
E com eles dançam um bom twist sobre mármores e flores artificiais.
Gosto, sobretudo, da poesia que denuncia os significados 
das insignificâncias do mundo.


Brasil

Em Lisarb existe uma máquina de triturar sonhos,
Com dentes humanos,
Movida por um grande braço de dor.
Em seu corpo, vermes holográficos
Deslizam contorcendo-se em vórtices
Engolidos por uma grande mola propulsora
Que os transforma numa massa uniforme,
Modelável, humana.


Hemisférios

Entre uma coxa e outra,
Entre uma virilha e outra,
Está ele,
O seu maior orgulho.
Ai de quem suspeitar de sua virilidade, de sua robustez, 
Ai de quem criticar seu comportamento, tantas vezes censurável.
Ele é sua luta, seu incentivo, seu sacrifício, sua satisfação,
O pai de suas gravidezes anuais,
Dos filhos igualmente protegidos.
Ele é o seu sucesso anônimo, o seu fracasso público.
Ele é o seu amor genital.


Real

Alegra-me a perversidade poética,
O ódio que se insinua nas entrelinhas do poema,
A imoralidade hiperbólica,
A sátira, a ironia, 
O sexo, o ritmo.
A rua, o riso.
Os meus versos
Não falam, gritam;
Não perguntam, acusam;
Desmentem, destronam,
Reprovam sem rimas.





Eu não escrevo poemas,
Descrevo a morte.
Meus versos são lâminas afiadas
Cortam segredos,
Sangram verdades,
Ferem vaidades,
Sem ter a pretensão de curar.





Galeria: Oana Stoian


Tereza Du'Zai, natural de Itajaí, SC, é poeta, contista, cronista e professora de Língua Portuguesa e Literatura. O tempo, a loucura, a solidão e a morte são temas recorrentes na obra de Duzai que, desde 2015, tem se dedicado, também, à literatura fantástica e gótica.

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