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| Ilustração: Paola Gonzales |
Ok. That’s it...
Derrubada a Ponte Entre Os Mundos.
Caem cometas planetas gametas sonatas sonetos.
Caem os reis réus ruas reais.
Soa a sineta pendurada no pescoço do Gato – é hora de desembarcarem os Ratos, com samba-enredo de Lennon & McCartney.
Explodem os espigões de Dubai e as cavernas de Bonito.
Exércitos de boyscouts e minions coreanos se enfrentam em busca de medalhas de lata.
Corre o povo pra praça, a receber as naves nibiruanas, a esperar que Lord Vader se digne a aparecer e ser o Síndico.
Correm meninos e suas pipas, meninas e suas bonecas (ou o contrário – quem se importa?), velhos e seus videogames, jovens e seus Mastercards.
Reúnem-se os políticos tentando escapar, como sempre.
Só que não tem.
Desta vez vai todo mundo: pobre rico bicha macho bicho planta rocha anjo e baterista do U2.
Sobra nada não. Fim cabô. Sem choro. Foi.
Estranham os que se esperavam elevados abduzidos arrebatados.
Fogem os puros de coração e os monstros.
E assim do nada, pelo meio do Caos, eles.
Shiva Superstar
Buda Superherói
Muhammad Superman
Zeus Super Moderno
Ogum Supertrooper
E o mais Super dos Supers: Jesus.
Ninguém sabe a que horas saíram juntos daquele boteco pé-sujo ali no Largo.
Verdade é que quando deram pela coisa, estavam os caras sentados em uma mesa, pão queijo e as últimas frutas da última estação servidas – começando a sessão.
Jesus abre os braços (onde se vê um pequeno coração flechado old-school com o nome “Maria” dentro – não era hora de perguntar se se referia à Mãe ou a Madalena), sorri aquele sorriso franco lá dele e diz: -“Bora conversar com cada um. Apanhem suas senhas com o Gabriel”.
Formam-se as filas, os caras alados descem das grimpas da Catedral – eu sempre jurei que eles existiam...
Fico ali, entre o Raphaelzinho e o Dono da Favela do Parolin, pensando se haveria privilégio pra algum.
“-Não há, guria – isso aqui não é mais Curitiba, é Armaggedon, cappicce?” – atalhou meu Anjo da Guarda, resplandecente com um par de asas que eu nunca havia visto antes, bonitão em seu jeans-camiseta-perfecto de gala.
E assim foi, horas a fio, a fria garoa escorrendo pelo cabelo – mesmo no final, teimosa Curitiba.
Uns subiam, uns desciam, de acordo com umas fichas que tinham sobre a mesa. E sem choro, sem discurso, sem tempo pra despedidas.
Correu a notícia que a Roda de Samsara estava suspensa, bem como as reencarnações, por pura falta de paciência do Grande Krishna, responsável pelo setor.
Decretaram carnaval na Faixa de Gaza, banquete na Somália, expulsaram os invasores da Amazônia. (Comentava-se que o repovoamento do Planeta iria começar por estas regiões, além de Samoa, Rapa-Nui e - pasmo geral - Pato Branco).
Os shows se repetem, desde Madonna até a Blindagem em sua formação original. Um telão transmite notícias sobre o andamento do Fim do Mundo pelo planeta.
Chega a minha vez, me aproximo tremendo: um sorriso de Sidartha, um abraço de Meu Pai Ogum, Shiva me manda um beijo assoprado. Maomé e Zeus me fuzilam com os olhos-medo eterno desses dois.
Jesus põe as mãos sobre meus ombros, olha bem fundo nos meus olhos e diz: “-Filha, você se fodeu tanto nessa vida que optamos por te dar descanso. Na próxima encarnação (assim que passe o mau humor do Mano Shiva), tu vai pôr o boi na sombra. Te deixamos voltar em Guaratuba, te damos o Dom da Felicidade. Só não te esquece de ajudar os outros, ok? Tranquilo?”
Maria Lorenci, nascida em Curitiba, engenheira civil, mãe de três, avó de duas. Escreve desde que aprendeu a escrever, mas começa sua carreira como escritora em 2014, com a primeira publicação, uma participação na coletânea Herdeiras de Lilith, organizada por Marilena Wolff de Melo Brafga para o Instituto Memória. Primeiro trabalho individual: Playlist para poemas selvagens, lançado em 2016 pela Coleção Marianas, Bolsa Nacional do Livro. Páginas no Facebook: "Maria lorenci" e "Dona Coisa e suas Histórias". Tem dois livros em fase final, lançamentos em 2018.