Quantcast
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

Uma Mulher Ruiva - Homero Gomes

Image may be NSFW.
Clik here to view.
Ilustração: Gosia T.


Extrema se tangunt.
“Os extremos se tocam.”


"O verdadeiro é o todo. Mas o todo é somente a essência que se implementa através de seu desenvolvimento. Sobre o absoluto, deve-se dizer que é essencialmente resultado; que só no fim é o que é na verdade. Sua natureza consiste justo nisto: em ser algo efetivo, em ser sujeito ou vir-a-ser-de-si-mesmo."

(George Hegel, Fenomenologia do Espírito)


Estava correndo quando recobrei a consciência.
Mas não suavemente. Os músculos de minhas coxas repuxavam, eu suava e ofegava, meu peito e abdômen doíam.
Não sabia por que estava correndo.
Refletia se eu deveria parar, respirar, mas estava em pânico. Estava fugindo, mas não sabia de quem. Olhava pra trás e não enxergava nada. A rua estava escura e silenciosa.
Eu não lembrava onde morava. Ou não sabia mais. Não reconhecia o lugar onde estava. Minhas mãos formigavam e eu sentia pontadas na barriga.
Em minha mão esquerda vi um bolo de notas graúdas e uma fotografia: uma mulher ruiva. Eu não a conhecia.
Talvez, pensava, eu a tenha assaltado. Por isso, o dinheiro e a fotografia. Mas eu não ouvia gritos nem sirenes.Nada. Corria, mas não estava em perseguição.Ao menos, era o que parecia.
Um grande estrondo e uma forte luz. Meus olhos viram um clarão antes que eu caísse no asfalto frio.


Com a vista embaralhada, aos poucos, consigo distinguir onde estou. Uma enfermaria. Ao lado, pessoas gemem de dor, sofrem, mas eu permaneço em silêncio.
Não sei por que estou aqui.
Um enfermeiro alto, magricela, olhos e cabelos negros começou a colocar medicamentos em meu soro.
Sua aparência me espanta. Tenho calafrios.
Dou uma risada nervosa e ele me pergunta simpaticamente se estou me sentindo bem.
Tudo bem. Não se preocupe, eu estou legal. É que você se parece muito comigo. Poderíamos até nos passar por irmãos gêmeos.
Isso seria impossível.
Rindo, pegou um espelho e colocou-o em minha mão.
Não sabia o que havia acontecido. Sabia apenas que o reflexo que via era o de uma mulher ruiva.


Conto publicado pela primeira vez há 5 anos na antologia Mundo Mundano.





HOMERO GOMES (Curitiba/PR, 1978) é autor de Sísifo Desatento (contos), publicado em 2014 pela editora Terracota – finalista do Sesc de Literatura – e Solidão de Caronte (poemas), publicado em 2013 pela editora Patuá – primeiro colocado no Prêmio Poetizar o Mundo. Publica regularmente em periódicos eletrônicos e impressos, tais como Cândido, Mallarmargens, Rascunho, Nego Dito, Cult, Germina Literatura, RelevO, Escritoras Suicidas, Reversos, Cronópios, Ficções e Zunái. Publicou as narrativas-crônicas de um personagem ficcional em www.jamevu.tumblr.com. Foi colunista dos sites Página Cultural, Musa Rara e da revista Samizdat. Teve poemas publicados nas antologias Fantasma Civil, da Bienal Internacional de Curitiba, em 2013, 101 Poetas Paranaenses, da Biblioteca Pública do Paraná, em 2014, organizada por Ademir Demarchi, e 29 de Abril: o Verso da Violência, em 2015, publicada pela Editora Patuá.

Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

Trending Articles