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Mapas de enclaves nos versos de Fernando Andrade.

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Manolo Millares (Quadro 111) em https://www.wdl.org/pt/item/13059/view/1/1/





PRIMAVERA

À moda Caatinga, um folclore amoldado
no qual seu soldado luta pelo soldo ou pelo toldo
quando está muito sol, quando está muito antigo.
Esta  canção solta feito de roda e de rodamoinhos
que giram, giram pelos seus ouvidos
como cantigas primevas e se eu não estou enganado
estamos na primavera que nem é tão quente,
pois quem canta aguenta à vera muitos clamores
que anda por todas as galerias do teatro.





A CIDADE É UM CORPO

Em um rosto
uma via respiratória;
um canal auditivo;
uma ponte entre
os órgãos competentes
e a saída para rua.
Teu rosto é uma cidade;
Ele envelhece como um tenente da polícia
que te encarcera entre os dentes;
Deixo te falar, a cidade é um corpo
com círculos-capilares.





A SALA

Sim, a sala está limpa.
Lugar de receber ( )
e está solitária.
Sim a sala vinca objetos que se apertam
em seus devidos lugares.
A sala não fala, alias, falava
com a voz da visita.
A sala foi sempre o centro dos ouvidos,
convide seus amigos
e verás que tenho razão.
A sala é a antiga civilização
traz consigo o experimento das conversas
entre seres antigos que portam vozes para falar e ouvir.
O pior suplício de uma sala é se acomodar em estar
e olhar somente suas peças, cômodas, sofás, poltronas.
Não ter a troca de formalidades entre quem vem e a própria vida.





LEITURAS

Um autor é também um leitor
como um cantor é um ouvinte.
Um autor é uma musa alegre
Assim como cantor é sua música.
O leitor é um autor que lê para si.
Com sua experiência inventou a leitura.
O autor é um músico que lida com a física
de um texto para atuar em cima
do palco ou cinema.





TEMPO PENDULO

Tempo, pêndulo
uma onda de curta duração?

pêndulo, temporal
Dá sua volta
num módulo do tempo do coração.

Pendura o tempo
no espaço da sua  revolta.

O pêndulo é parte do nódulo no luto
dá sua volta  (tempo) na apuração dos minutos que luto.

É estranho este tempo escoltado
preso na máquina deste relógio.





TRATO

Te trato
Onde existe
limite
para a voz.
Onde o texto permite
algum alcance.
Onde a memória
insiste
em perdurar.
Este chão
uma ação
uma lembrança
uma criança
um ator
desdobra o espectador.

Onde está o teatro?
Este jorrar de linguagem
do texto escrito
que vai muito além do trato
de verossimilhança
entre máscara e rito
entre experiência e ficção.





EFEITO AUDIOVISUAL

Um efeito audiovisual
não lhe remete a um pose, não lhe dá medo?
uma sensação usual lhe dá posse?
de algo casual embora seja apenas um arremedo
de uma imagem borrada
em tons pictóricos, o processual
do que se esconde através da foto
desta praça, neste querido espaço surreal
onde o que se vê é prioritariamente já esquecido pelo fora do quadro.





ZERO ERUDITO

Zero erudito
estudou ciência matemática,
ele mesmo um 0 à esquerda.
Lutou redondamente na guerrilha.
Na ausência de sentido
ouviu a mensagem enfática

que todo erro é um tipo de maravilha!



(todos os poemas aqui publicados integram o livro Enclave, lançado pela Editora Patuá)




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Fernando Andrade, escritor e poeta, e jornalista, tem três livros de poemas: Lacan por Câmeras Cinematográficas, e Poemometrialançados pela editora Oito e meio, e Enclave, lançado este ano pela Editora Patuá. Participa do coletivo de Arte, Caneta lente e pincel, com contos e poemas. também participa do Trema Literatura, coletivo de textos de ficção. Tem, entre seus escritores mais amados, Thomas Pynchon, Ìtalo Calvino, e no cinema ama demais Krzysztof Kieslowski.

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