Por Marcelo Ariel
A voz lírica que se move oceanicamente dentro de uma dimensão epistalográfica, resiste a ser fantasmagorizada, desde suas topologias repletas de irradiações intensas e cifradas até uma outra enterrada no espaço museológico do espírito humano, esta voz é de certo modo ressuscitada nos poemas de Mell Renault e encontra neles uma potência sutil que se move na contramão de nosso tempo de dissipações e nadificações. Como em Florbela Espanca, estamos em uma zona limite onde a evocação do fenômeno amoroso tenta escapar de racionalizações e de um esquadrinhamento lógico, sentinentos vastos se movem em espaços do impossível que para além de nomeações constroem as bases do que chamamos de vida real, pulsões e emanações da natureza se movem de dentro para fora de conceitos e ilusões, há um coragem em assumir um deslocamento e estranhamento que aparentemente parece ser simples porque seus códigos foram cada vez mais gastos e até assassinados pelo senso comum, por isto há uma urgência de pássaro contornando os vidros de arranha-céus no resgate do lirismo romântico.
*1*
a ausência agita a página.
Te crio aqui
impressão da sua imagem consagrada.
- Sua falta fez brindar as taças.
...
Estou afetada
pela esperança
Vontade de fugir
e escondida
me mudar
para dentro do silêncio profundo.
No canto superior
do teto mofado
Ser rocha
que se dissolve
na onda.
Ser o caminho final
do passo,
a marca do sem nome
na areia.
...
Só queria respirar profundo
diante a ventania
e
Sent(ir)
que ali também estou.
Fica.
*2*
O silêncio se desgasta
e o verbo solto
em constante perigo
Se perde.
A palavra dissolve
no céu da boca.
Tudo escapa.
Sentimento expande,
o limite.
O corpo em intervalos
de acasos
alimenta
o que em mim é crú.
Teu verso reverbera
E enche de ar meus pulmões.
...
Em nós, o amor ama.
Versos cheios
de carne.
Fica.
*3*
Corpo Casulo
Corpo Fatal
aqui me entrego
à deriva.
Coração prisioneiro
da vigília
Suspenso
em suspiros
Deixo-me inteira
para que me leias
com a alma aberta.
a pressa da pressa
empurra
a palavra
nesse
Corpo Beco.
Então hoje,
Corpo degustação
rasgando o silêncio
das impressões.
agora, não sei falar.
Sinto.
Teu olhar nú
me espia
pela fresta da porta.
Fica.
*4*
amo em ti tantos outros que neguei.
Eu sei, a cicatriz
da outra
Cicatriz
não curada,
nesse momento
a palavra inflamada
Arderá
no (anti)verso
que escrevo.
Verás assim minha outra face,
Coração estalando.
Ficaremos tu e eu cercados por dentro,
teu verso dirá o indomável.
...
Amar, Poeta, é além.
Fica.
*5*
salgada e úmida é minha palavra hoje.
Meu corpo não quer mais ser corpo.
Dói
as mãos
a voz
o lado esquerdo da alma.
(...)
Essa vida aqui inventei para continuar vivendo, em ti.
Logo
Tudo acaba,
menos o amor
esse
Transvive.
Fica.
*6*
procuro teu abraço na asa aberta do pássaro.
...
Teu verso, profundo oceano
acalma meu corpo.
Nessas noites líquidas, busco-te.
São teus olhos
que regam meu amor.
Na língua, minha fala calada,
entalha enredos na sua boca.
...
Frágil mudez grita em mim.
a vigília dos gemidos.
Fica