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10 poemas de Elisangela Braghini

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Mira Nedyalkova


TROPEGO POEMA AO ALBATROZ
(Les Fleurs du Mal - Baudelaire)


Imaculadas majestosas
velozes asas
em instantes pontuavam cardeais
desenhando estrelas

sucumbem quedadas
aos efeitos colaterais
- nefasta gravidade, das flores do mal!

Inúteis
desafinadas
o poeta obrigam perambular 
mente ao chão coxear
entre os mortais 
mendigos de atenção

A cobiça em expor em museu
o adorno carnavalesco relíquia "in memorian"
ao ser alado
os cega
é o algoz do albatroz

mal sabem -
o mau - o que fazem?

asas atrofiadas o envergonham
podadas ressuscitam siderais
arrancadas sepultam
a alma viva
do monarca dos azuis



COMBATES


Travo guerras amorfas
não sangram jornais
antes rasgam palavras

silenciadas
distantes telas
bloqueio - as
pálpebras no cristal

óleo de peroba
derrete-se nas caras
de pau
nas peles - arranco
dos cordeiros
que uivam - verão
aquecem meu inverno

Crio nos amores que invento
belos/deliciosos/sevados
os sirvo
à ceia que sacia

digiro-os enquanto sonho
à aurora
descarto-os
na descarga

doida raiz
aprisiona-me
refém do silêncio
abusa-me!


DESPEJO


Dissipo-me dos trajes
que ontem usei no circo
Meu humor mudou-se
com eles

fora de mim
não minto
nem faço rir
enxergo a nudez apática
que soa sátira
mas é dor

Limpando a falsa lágrima
maquiadamente escrevo
livro-me
em público -
entre as capas
entre aspas
que não me contém

andando leio
o livro
com outra face

enquanto aguardo - absolvo-me
no cálice e não calo - o poeta livre
andar errante educadamente
a arder-me os olhos
queimar-me a pele
cremar-me a carne
incinerar-me os ossos a pó

calcificar-me em lava
ou lavrar-me após a chuva ácida
as páginas em branco


MOSAICO

 
Às vezes parto
quebro em mil pedaços
o desespero
dos anos lapidados em aço

Dos restos garimpo artesanato
aleatórios rejunto
os cacos reencontrados
as máscaras de sorriso cravejadas
no monstruoso mosaico

Se deserto o futuro
que me propõe lascivo
deserdas o presente 
que te descreve frívolo


LÁPIDE

 
Amor, faleceu...
Sedento, sob o céu
faminto
no tempo
de lavrar palavra!

meu amor, não resistiu ao peso preso
à lápide
à cruz
a rosa não ousou beijar!

carne e ossos
humano,  fraco...
sucumbiu ao suave voo
ao silêncio escuro
ao não olhar...

Sem tempo,
não há mistério!
alma  partida -
asas à sombra da árvore ao vento!

meu amor, foste!
Se lapidasse esse dia...
amante
Se lapidado - Sem trincas -
aceitasse o não-espelho!
Se...
Sempre...
Se amanhecesse o invisível - não falo... - ainda existe!


Mira Nedyalkovar

LAPIDANDO


Esse homem virgem
às vezes me sorri em verso
Devorando-me em vertigem

No novo universo
em voo liberto
como sempre quis
sussurro em meu canto!

Em tudo o que diz
Mina raro o amor
em inesgotável fonte
um lapidado diamante...

Ele, intransigente
Intransitivo
Indireto verbo
de um tempo que não existe:
Deixa passar!
Deixa pra depois!
Espera o olhar
por nós dois...


EXÓTICA POESIA


É poesia apesar ...

o amargo mofado
na casca da ceia
casado - tão perfeito! -
ao   espumante adocicado
putrefato –

amanhecidos
- em campo fértil
que nos serve de leito brindamos
ao vento
ao luar
promessas no olhar
os dedos em cruz
a jurar segredos sagrados ...

É poesia apesar...

o sangue coagulado requentado
encerrado na cova
dos dentes alvos
que rasgam carnes
trituram ossos

exibem - dramático esse tango,
onde cochilo e vomito o vinho que sorvi! -
nos lábios- sorri - sedutora rosa!

exala irresistível odor:
amor - boreal colorido na aurora!

É poesia apesar...

Feto, inda agora, inédito, fez-me provar, entre as coxas e no dorso - a língua silenciosa! - a tua pena - lambe-me - suave encena, encera e compõe minhas asas distantes nos voos por tantos sóis e blues...

É poesia apesar...

alquimia sólida,
fórmula derretendo-me no gozo - seio e sexo - corpo e  alma - e tão bem, embora náufrago, descreve-me!

É poesia apesar...
afora
exótica lágrima
pesar!


PORTA-RETRATO


Ao amor não assiste perguntas ou respostas

de joelhos agradeço
mendigo palavras
que auroram poesia

engasga-se
revelando-me o futuro
seu silêncio místico...

linguagem de sinais copio incompreendido
nas mensagens o socorro
garrafas lançadas ao mar
naves sem rumo

em desconhecidas órbitas
sigo (estrelas que não existem)

enquanto a ampulheta traga
o deserto de rosas

na praia
o milagre do tempo espero
sem medo
revolto o mar
navego

repousa tranquilo
em meu colo
autorretrato
vitrificado
o desejo explícito
seu olhar salgado  


MISTÉRIOS DO GRAU


O desejo de possuir o harém
em mim - furioso
entusiasmo- em Julho Evola
reticente, a dignidade humana...

Cavalgas o tigre na penumbra transcendente
Eunuco, fiel sangue, às tradições e às máscaras
antimoderno, projeta-se hierárquico
superior, o clã que te escraviza

O amor em que reino,
além do visível,  metafísico,esotérico,
singular e supremo, castras!

Abala-me  o âmago a força,
mas não espero o futuro
instante espontâneo que não surge.

Crio-o constantemente
se falha
resta-me o sacrifício derradeiro!


BUCANEIRO
 
essa flama
pira o atlas
atrás piratas

pra nossa cama
branca bandeira

no corsário
acena pop 
a caveira
- veneno
ou rock? -

imaginei um marinheiro náufrago
saqueou-me a alma o bucaneiro lorde

destina-me à prancha

mergulho
em meu ego

naufrago
encontro o forte
a fantasia que me possui
possui(r)-te!



Sou uma Rosa dos Ventos tupiniquim, que do sul ao norte, do sudeste ao nordeste transita com o sentido da infantil descoberta: diante de tudo se encanta e se entrega. 
Escrevo secretos diários de viagens desde criança. Gosto de brincar com as palavras, resenhando livros, filmes, opiniões, homenagens, sabores, impressões, músicas, enfim, tudo o que vejo e sinto, em poesia.
Sou advogada há 22 anos e há poucos dias, a ponte invisível entre o direito e a arte começou a parecer sólida. Hoje ouso a travessia...




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