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5 POEMAS DE ANDRÉ LUIZ COSME LADEIA

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1)
Início

... E não havia nuvens
E não havia homens
O mar reinava absoluto

E não era possível
Distinguir o que era céu
Do que era mar
— E tampouco
Onde começava um
E onde terminava o outro —
Porque as distinções
Ainda não existiam.

E não havia deuses
E não havia homens
A linguagem não podia nos aprisionar
Porque ela também não existia

E não havia papel
E não havia tinta
E os poetas sequer existiam
E não havia nada mais
Do que já não existia por aqui

E apesar de não haver
Nuvens, homens ou deuses
E apesar de não haver papel,
Tinta ou poetas
O mundo não era um lugar triste
Porque havia o mar
E havia a poesia
E a poesia era tudo.




2)
Berço do Príncipe Imperial Eugène-Louis

Se não fosse pelo fato de o berço
Ser como qualquer outro berço

Se não fosse pelo fato de o menino
Ser como qualquer outro menino

Se não fosse pelo fato de a coroa
Estar suspensa pelo rei
E os anjos guardando o sono da criança

Eu diria que seria um berço qualquer

Mas não.

O berço, o trono, o quarto
Estavam
Vazios.




3)
 Wabi-Sabi - Oceanário de Lisboa

Por mais belo
E confortável
Que possa ser

Por mais aprazível
E próximo ao habitat
Se possa reproduzir

Um aquário
Será sempre
Um aquário

Uma hora
Os peixes
Vão se cansar
Dos espelhos refletidos
Das mentiras
Da floresta subaquática

Uma hora
Os peixes
Vão se cansar
Dos sons
Vindos
Das máquinas
Fotográficas

Uma hora
Os peixes
Vão se cansar
Dos pseudossons 
Da natureza
E dos 78 troncos
De árvores
Da Malásia.

Uma hora
Os peixes
Vão se cansar
Das nossas caras.




4) 
Imperador

A música do imperador
Dizem
É conhecida em toda a Europa

Os estofados
As lantejoulas
As alcovas
São conhecidas em toda a Europa

Dizem que o imperador acorda cedo
E recebe a todos que queiram lhe falar

Dizem que o imperador
Deu um castelo para sua amada

Dizem tanto
Falam tanto
Do imperador
Que é como 
Se ele ainda
Existisse
Como se ele
Ainda
Estivesse vivo




5) 
Poema feito na estrada

Que tristeza ver as cruzes com flores pelas estradas
As borboletas voando 
Sem vento
As folhas paradas
Que tristeza ficar
Pelas estradas



*    *    *




André Ladeia é poeta e procurador municipal. Autor de Suave como a morte (Penalux, 2014) e Alçapão (Oito e meio, 2016). 














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