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6 poemas de Bruno Bandido

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Sobre os corpos descobertos

A casca de tinta
das paredes velhas
camufla o último grito
de criança louca
- uma nuvem
entre os que aguardam
na selvagem descoberta
e o que vai chegar
para sempre
indefinido.
Jamais houve romance
nos olhos
de alguém.



Discurso ao funeral do meu pai

Houve no mar
- meu pai disse -
um princípio de som

(sereias
porque era belo)

Dias depois
não muito antes do porto
um dos soldados
pediu atenção
e mijou no mar

- meu pai disse -
nunca viu
mijo mais longo




Hotel Europa

O hotel não fede a cigarros
mas poderia
também não faz frio lá fora

(prostitutas tomam banho
de sol
enquanto os filhos
nadam em piscina natural)

a bunda da camareira
ao dobrar os lençóis
(dentro de um livro
da Yoko Ogawa)
                              
sempre gostei da
imagem : camareiras fumando
entre um quarto e outro

acendi um cigarro
ela abanou
suas mãos -
saia longa
infinitas
melenas

tive vontade
mostrar o meu pau

evangélicas chupam paus
como gordos em dieta
comem escondidos de si mesmos

como adolescentes fumam
longe dos pais
e fingem que eles
não sabem
                       
é o mesmo princípio
só que com Deus.



Amigo                     
  
o cachorro sem olhos
que minha filha tirou da rua

as mordidas carinhosas
em meu calcanhar

se até ele sabe
que toda carne é sensível

se até ele
ataca com a suavidade
da garoa

por que meus sonhos
são a natureza de um
testamento antigo?

socos que machucam
a mão de dentro


Unhas Negras

Unhas Negras fede a
morte e a lascívia
na porta da boate,
canta sua melodia
nova e velha
com seu rosto novo
e velho
(voz de medusa
no chuveiro).
Unhas Negras frágil
feroz
como se Miguel
abusasse outro anjo
e nascessem os
demônios
mais belos
- que são as flores
mortas
e o mar durante
a noite.


Amanhã

Amanhã você morre
o síndico da morte                                    
espera. Ele que ergue
nossos pecados, ele
que lambe seus
pezinhos pretos de
atriz de teatro.
A te chamar pelo nome
pelo rádio relógio.

Amanhã você acorda
o senhor do abismo
não sonha. Ele que rasga
nossos bilhetes, ele
que come o dentro
dos ossos.
Amanhã você engole

algodão de rímel
cabelo de ralo

pra que o senhor do
delírio, que pune
nossos fetiches,
jogue conhaque
em seu vestidinho
curto
de funeral.


Galeria: Daniel Fama




Bruno Bandido nasceu em 1990, na fronteira com o Uruguai, passou pro Porto Alegre, Salvador e hoje mora em São Paulo com sua mulher e mais dois vira-latas. Em 2014, lançou o livro de contos Tem um palhaço agressivo e um hooligan triste em algum lugar aqui dentro pela editora Bartlebee. Este ano, seu conto Fonte do Boi foi publicado pela Bar Editora. Também prepara um livro de poemas chamado Histórios de Gólgota. Escreve no blog brunobandido.wordpress.com.


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