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3 poemas de Isabel Furini

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Ilustração:  Stephane P.


A EPIFANIA DOS ESPELHOS

o que posso fazer? – além de envelhecer
e sonhar eternidades?

olho pela janela a suave chuva
e enxergo o vento nás arvores coníferas
estou em Seattle
em esta solidão de bosques e de prédios
e de ruas desertas
e de lagos serenos
por diversão desmembro o tempo
imagens e fatos
emoções e pensamentos
navegam no rio do ontem
e tentam fazer uma ponte
com o amanhã desconhecido

Se eu tivesse uma jaula para encerrar o tempo
viajaria por mundos paralelos

e faria um inventário quixotesco
dividiria o tempo dos homens
e o tempo de Deus – inalterado
e o tempo da formiga e o tempo do amado Mestre
e o tempo de tristeza e solidão
e o tempo do reencontro e do amor verdadeiro.

porque poucos conhecem a verdade
:
os deuses gregos criaram um labirinto de espelhos
para o amor
por isso os homens só enxergam seus reflexos

o amor verdadeiro tentou fugir do labirinto
do mundo dos espelhos
e foi condenado pelos deuses do Olimpo
e ainda está em um universe paralelo
encerrado na caixa de Pandora
e transformado em um ser inaudível
o amor não foi transformado em palavra – mas em profundo silêncio.



MAGNUM OPUS 2

A pedra filosofal está escondida
nos interstícios das emoções
e acorda as sombras
que murmuram diante dos espelhos
e as incita a construir versos
com a argila de palavras e silêncios

nas águas do lago das emoções
(em círculos concêntricos)
o vento agita sombras e recordações

a luz das velas sombreia o passado
e os pesadelos
sitiam a alma do poeta

poligonais sentimentos
espreitam o lado escuro do universo paralelo
onde dormem os versos

e os fantasmas murmuram poemas
perto dos ouvidos de um poeta
e fazem tremer
o coração em sombras

na retorta alquímica
a mente do homem é dissecada
sonhos e pesadelos se confundem
na caverna ardilosa da memória

como um barco entre ondas de água
de mercúrio e enxofre
aproximam-se as recordações
e as emoções
de todos os poetas alquimistas que tentaram
recriar a pedra filosofal

a aldrava dos sonhos
abre-se diante dos olhos amedrontados
do poeta
e a vida com suas ululantes verdades
apresenta antigas filosofias

as chaves do outro mundo estão guardadas
no cofre do inconsciente
e o pé de romã guardado pela serpente da solidão
invade o território do silencio.

foi com uma romã que o deus Hades
enfeitiçou a bela Perséfone
chorou Demeter
e suas lágrimas convertidas em flores
iluminaram a Terra.

ancora nos olhos do poeta o mercúrio do amor
a enfeitiçada humanidade corre procurando o ouro falso
e deixa o ouro da alquimia esquecido no porão

nas noites de insônia
enferrujados conceitos são renovados
ecoam nas retinas
as verdades dormidas de outras vidas
e o poeta pensa
:
sempre há espaço para flores e serpentes
no deserto inóspito da mente
e na dimensão infinita da Poesia.



MAGNUM OPUS III

o ouro alquímico
permanece refletido nas sombras dos espelhos quebrados
e dos sonhos irrealizáveis
nesses espelhos os fantasmas falam  perto dos ouvidos
fazem tremer o coração em sombras
e as imagens do ouro alquímico serpenteiam
no espaço-tempo
e atraídas pelo horizonte de eventos
sonham com a possibilidade de voltar ao caos primordial

a linha do horizonte
esconde-se nas retinas e no oceano de enxofre ou de mercúrio
enquanto o Sol ilumina rústicas máscaras
e permite sonhar caminhos de ausência

o mundo é percorridos em exílios voluntários
e em viagens imaginárias
que iniciam em portos de fantasias
e em labirintos de espelhos
onde mora o Minotauro dos sonhos
entre linhas paralelas de tristeza e esperanças

alquímicos sonhos avançam
para atingir as almas dos poetas
essas almas transitam por caminhos esquecidos
desabrocham em outra realidade
pois muito além deste mundo
existem símbolos abstratos
percebidos pela subjetividade

o milimétrico arquitetar da linguagem simbólica
faz do poeta um ser capaz de realizar a leitura do mundo espiritual
as vezes a leitura é resumida em uma caricatura de palavras
ou em construções precárias

o ouro alquímico-poético
revela-se na linguagem dos sonhos
e modifica
as imagens gravadas nas bussolas dos navios
nos relicários antigos
nos leques imaginários
no crocitar dos corvos
e nos moinhos do tempo movidos pelos risos e as lágrimas de cristal

esse piar de pássaros noturnos
marca os contornos da alma e da poesia
o poeta compreende o mundo das ideias de Platão
as águas do rio de Heráclito
e a metamorfose kafkiana

nada foge da percepção aguçada  do poeta
nada
nem a água de batismo nem a noite infinita
nem enxofre do ocaso
nem mecúrio da vida
nada
exceto a realidade cotidiana




Isabel Florinda Furini é poeta e escritora.  Sua paixão é a poesia. Seus poemas foram premiado no Brasil, Espanha e Portugal. Em 2015, participou com poemas de exposições em Lisboa (Portugal) e Buenos Aires (Argentina).  Publicou 30 livros, entre eles, o livro de poemas Os corvos de Van Gogh. Foi nomeada Embajadora de la Palabra pela Fundação Cesar Egido Serrano (Espanha), em 2014; e Embaixadora Internacional e Imortal da Poesia pela Academia Virtual de Letras, Artes e Cultura do Brasil, em 2015. É membro da Academia de Letras do Brasil/ Araraquara; coeditora da Revista Carlos Zemek de Arte de Cultura e organizadora do Concurso Internacional Poetizar o Mundo.

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