viver
“I don’t want to die, me! I want to stop
alive for ever, if only to see the ships pass.”
G. B. Edwards, The Book of Ebenezer Le Page
alive for ever, if only to see the ships pass.”
G. B. Edwards, The Book of Ebenezer Le Page
nem que seja só para me sentar na
areia da praia e olhar, lá longe, os
navios passarem. e sentir, ao meu
lado, a respiração de uma garota
de cabelos castanhos (supondo o
brilho dos olhos dela olhando o mar).
viver nem que seja só para, quando a
noite cair e trouxer com ela o frio,
olhar a lenha queimando no fogo. e
ora a garota de cabelos castanhos, ora
eu, vez por outra ajeitar a lenha
e alimentar o fogo. enquanto falamos
dos navios que, de dia, passaram
diante dos nossos olhos.
areia da praia e olhar, lá longe, os
navios passarem. e sentir, ao meu
lado, a respiração de uma garota
de cabelos castanhos (supondo o
brilho dos olhos dela olhando o mar).
viver nem que seja só para, quando a
noite cair e trouxer com ela o frio,
olhar a lenha queimando no fogo. e
ora a garota de cabelos castanhos, ora
eu, vez por outra ajeitar a lenha
e alimentar o fogo. enquanto falamos
dos navios que, de dia, passaram
diante dos nossos olhos.
o dia
Depois de Driving Montana, de Richard Hugo
o dia é uma garota de vestido estampado
de algodão florido laranja e branco, que te ama,
ou que poderia amá-lo. que tem olhos bem abertos,
castanhos, cabelos castanhos. o dia é de sol e o céu está
tão aberto. é uma música ruim tocando ao fundo.
é a vontade de fazer uma besteira e se casar
com aquela garota. o dia é amar o castanho dos cabelos
dela, é amar o vestido de algodão florido laranja e branco.
e as sandálias havaianas que ela calça. o dia é tanta
e tão pouca coisa. o dia, e amanhã.
de algodão florido laranja e branco, que te ama,
ou que poderia amá-lo. que tem olhos bem abertos,
castanhos, cabelos castanhos. o dia é de sol e o céu está
tão aberto. é uma música ruim tocando ao fundo.
é a vontade de fazer uma besteira e se casar
com aquela garota. o dia é amar o castanho dos cabelos
dela, é amar o vestido de algodão florido laranja e branco.
e as sandálias havaianas que ela calça. o dia é tanta
e tão pouca coisa. o dia, e amanhã.
de como eu serei lembrado
depois de “how you know me”, de Franz Wright
no sétimo dia do mês de maio, do
meu quinquagésimo quarto ano de vida,
logo cedo, o sol ainda meio escondido
em meio à bruma da manhã, eu tive uma
visão. garanto a você que foi forte e marcante,
mas não consigo descrevê-la. não posso. eis o que farei:
acenderei uma vela – mesmo não sendo religioso –
para meu pai e para alguns outros parentes
e amigos que já se foram, e rezarei.
meu quinquagésimo quarto ano de vida,
logo cedo, o sol ainda meio escondido
em meio à bruma da manhã, eu tive uma
visão. garanto a você que foi forte e marcante,
mas não consigo descrevê-la. não posso. eis o que farei:
acenderei uma vela – mesmo não sendo religioso –
para meu pai e para alguns outros parentes
e amigos que já se foram, e rezarei.
ah, as estradas sinuosas, aquelas noites, a
brasília branca, apagar os faróis para viajar
sob a luz da lua, bob marley cantando
no toca-fitas, johny walker (rótulo vermelho) no
gargalo, passado de mão em mão.
brasília branca, apagar os faróis para viajar
sob a luz da lua, bob marley cantando
no toca-fitas, johny walker (rótulo vermelho) no
gargalo, passado de mão em mão.
* * *
André Caramuru Aubert nasceu em São Paulo em 1961. É editor, tradutor e escritor. Já colaborou com publicações como O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil. Atualmente é colunista da revista Trip e colaborador do jornal Rascunho, para o qual mensalmente seleciona e traduz, entre seus preferidos, algum poeta estrangeiro. Publicou, pela editora Patuá, o livro de poemas Outubro/Dezembro e, pela editora Descaminhos, os romances A Vida nas Montanhas, A Cultura dos Sambaquis, Cemitérios e, agora em novembro, Só uma estranha luz como pensamento.