Quantcast
Channel: mallarmargens
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

Deuses e Mortais - Diego Callazans

$
0
0



os deuses também são gente,
de idêntica flama interna,
mas a grandeza lhes prende
à idealidade da esfera,
até que Hermes, dizendo
que chato!”, se faz menino
e põe nos deuses defeitos;
ser imperfeito é divino.

.....................................................

que os deuses ajam não espere.
serem alheios nos serve.
um pouco de agrado é manta.
é renda, se mais, de aranha.
a indiferença é uma prenda.

.......................

os deuses não fazem nada ao acaso.
há planos a que não temos acesso,
qual cartas em caracteres opacos.
um iluminado quiçá desvende
parcos enunciados, tão dispersos
que na divina sua doutrina emende.




na mão não canta o mistério.
com o dito jamais se deita.

não há com o que se o ferre.
a carne o sabe, não o porta.

deixemos que passe alheio
o que mais dentro ressoa.

não vem da areia esse gesto
que diz ao vento: “disperse”.

pra deuses não nos fizeram.
a águia, se ousarmos, desce.

...........................

ser homem é profissão
de carga.
o pasto chama a mais
deleite.

melhor do que a razão
é a alegria!

Odisseu, desista.
alguns homens preferem
seguir porcos.

e por que não?
tantos já porcos são
no corpo errado.

sorriso é
pança cheia e cuca oca.
provar da lama
sem saber panela.




querer que eu seja
a calha
- ora Zeus valha! -
do que fui antes!
como, se antes
eu era outro?

o que conservo
(tão breve sou)
de minhas idas
versões?
me atualizo e
mais não me sei!

pagarei eu por
qualquer desplante
de um meu farsante
que, ora sido,
me nada deixa
senão coleira?


Ilustrações: Gian Lorenzo Bernini (1598/1680)



Diego Callazans nasceu em Ilhéus (ba) em 1982 e mora em Aracaju (se) desde criança. É autor de A poesia agora é o que me resta (Patuá, 2013), Blasfêmias(7 Letras, 2015) e Nódoa (7 Letras, 2015). Tem poemas publicados em diversas revistas literárias.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548