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O silêncio e a metalinguagem na poesia de Joelma Bittencourt

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Ilustração de Deborah Dornellas


Sonho náufrago

Lida árdua
de poeta termina
quando chega o tempo
de lançar poemas
feito garrafas ao mar

mira que lindo
poemas boiando

se levam mensagem
até na cortiça da tampa
quem se importa com isso

ah
mira que lindo
poemas boiando!


*

A primeira essência

Sob que condição
originou-se esta ânsia
pelo silêncio

datada de séculos
se de milênios
no espaço sideral

vinda na queda
de meteoro arremessado
por explosão dalgum sol

ou barulho colossal
que me fez gostar
de ensurdecer
?

*

Dos exercícios de escrever

Agora há uma noite vestida
de acompanhante
calha de ter grilos ao sereno
um aconchego mudo do lado
de dentro

sem os guizos humanos
a isso nomeio silêncio

agora devo estar em tua
companhia
se sabes o que penso
sobre guizos
estamos conexos

cá estou pensando se calha
de estares numa hora de sol
se calha de nos imaginarmos
em eclipse.

*

Guia do leitor

A olho nu
a vista é vasta iluminura
do ar de nossa graça

de pé
ou boiando na maré
dalguma sorte passageira

mãos ao alto
e cara de paisagem
que é pro tempo render
nossa viagem.


*

A espera da moldura

Repartirei
meu milagre
com o que tem
fome de fé

e este o repartirá
com outros
até que o milagre
seja todo servido

assim
a fome de fé
continuará a produzir
mais milagres.

*

O antiquário

No futuro
o lado de dentro
do poeta
será mudo

e o poema
com seu comboio
de cordas
desatrelado

será reserva
num banco
de dados.


*

A raiz da flor da pele

Nem sempre dá
para salvar o poema
de ser gente

quando lhe veem cabeça
ele até pensa
quando lhe põem pernas
ele graceja uma polka

se lhe dizem malícias
ao pé do ouvido
ele descobre que tem sexo

às vezes se cobre.


*

Contemporâneo

Já não é chamativo
fundamentar o mito
ou decantar o canto

a moda de hoje
é servir a sereia
em postas.

*

Amostra grátis

Húmus
por todo lado

eis que uma rosa
metaforizada
teima absoluta

sorve chorume
expele esta nota
perfumada.


Joelma Bittencourt: Paraense, formada em Letras pela Universidade Federal do Pará. Atualmente é professora na rede estadual de ensino. Apaixonada por poesia, escreve desde a adolescência. Possui textos publicados em redes sociais, blogs coletivos (Falsidade Ideológica, Dardo, Poetas Vivos) e livros de amigos escritores.
Ilustração de Deborah Dornellas.

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