pra recitar um poema de restos
primeiro, da massa amorfa, separam-se recicláveis:
os sons, separá-los em clave,
a partir do fole profanus,dosar o ar tépido
à vibração epifânica da epliglote
cuja ressonância no malemolente palato
titila cócegas ('til they come) ao clímax da úvula
de sorte, dixit, que os resíduos sólidos | fonemas
(cada qual ciente do en
clave) sejam recompostos, após clivagem, numa só pauta almaço
só lidos após uma alma em pauta: pentagrama da sintaxe
quando dispostos então estejam à compostagem:
mergulho aeróbio na substância húmica
outrora lixo orgânico (restos de noite insone
dias arrastados ao sol sustenido
o que se expele de glândulas sebáceas e farruscos orifícios
o que se verte, sem tratamento, pelos dutos lacrimais
o que corre, compasso vário, nos vasos comunicantes
enfim, todo o caldo condensado na memória) de
cantar até que a mistura não seja nenhuma da
quelas, mas sim todas elas | biomassa da pa
lavra que cava a grafia, ferra a queloide (abra-se tétano,
gleba sem porteira) e lhe entorna o suco tipográfico
da composteira | mel do cântico
entoado em goles na forma | favo
que adoça, endossa o sentido | o pensado, logo
material pra descartes ou matéria do inefável?
Artur Ribeiro Cruz nasceu em Sertãozinho, interior de São Paulo, em 1981. Mudou-se para São José do Rio Preto para estudar Tradução na Universidade Estadual Paulista, onde também desenvolveu mestrado em Literaturas de Língua Portuguesa. É professor de linguagem na educação básica e no ensino superior. Dedica-se também ao estudo comparado entre literatura e cinema, área em que desenvolveu pesquisa conjunta, nos anos de 2002 e 2003, intitulada Cinema e literatura brasileira: problemas de transcodificação, interferência e recepção. Em 2009 publicou, em coautoria com Antônio Manoel dos Santos Silva, O cineasta e a margem do rio imaginário (Arte e Ciência Editora), resultado de estudo comparativo entre as obras de Nelson Pereira dos Santos e Guimarães Rosa. Publicou, em junho de 2015, Semanário do Corpo, pela Editora Patuá.