Quantcast
Channel: mallarmargens
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548

4 poemas de Martha Galrão

$
0
0
Ilustração: Alain Etchepare




O afogado mais formoso do mundo


Você é o afogado 
mais bonito do mundo

Retiro do seu rosto branco
os matos de sargaço
e os filamentos de medusa

Revelo a beleza
de suas sobrancelhas ruivas
incandescentes
rubras.



Leão


De repente
o alumbramento
sua bravura flutuando em ondas.
Antevi sua nobreza
a flor de lótus que brota
do seu umbigo.

Como esconder dos mortais
sua coloração castanha
impressa em minha íris?
Como esquecer
o delicado roçar das cabeças
a cernelha, as lambidas?

Corro, louca, pelas savanas
tomada pelo desejo
que você, carnívoro,
me apanhe e me coma
metade homem , metade bicho.



Saudade

o que me mata
é o silêncio
e o beijo
não ser na boca

o que me mata
é a falta
de seus olhos
nos meus

o que me mata
é a ausência
de mãos
e palavras


o que me mata
é esse breu.



*

Vou ali chorar e volto.
Juntarei minhas mãos em concha
depositarei lágrimas, com cuidado, até as bordas
e entregarei à terra.
Desse encontro vingará
a cabeceira do rio.

Seu leito não aceitará cuidados
pois é mais forte que eu.
Sulcos de lodo e segredos,
matas de alegria, pedras indomáveis,
sedimentos de saudade e amores mal acabados.

Amanhã chorarei de novo
depois de amanhã também

para alimentar seu curso
de água, sal, sofrimento.
Nesse rio caudaloso
banharei o transtorno, a urgência,
a virulência do sentimento.

Em sua foz,
um dia,
me deitarei
e morte.





Martha Galrão (Salvador-Bahia), graduada em Psicologia, prefere ser poeta e professora. Participou das antologias poetas@independentes(2007),  pórtico 3 (2009) e Todas as Mãos, Antologia do Caruru dos Sete Poetas(2014).Autora de A Chuva de Maria(Kalango, 2011), Muadiê MariaColeção Cartas Bahianas(P55 Edições, 2013), Um rio entre as ancas, Coleção Pedra Palavra(2013).

Viewing all articles
Browse latest Browse all 5548