Não sou suicida
............ para Delmira Agustini
.
Se Sylvia, se Virginia
Se Florbela ou Ana Cristina,
Delmira não.
Onde estas sucumbiram -
na asfixia de seu desconforto,
no rio mergulhado com demasiada profundidade,
no eterno sono veronal,
no voo livre e descendente -
ela, num ímpeto de saber-se quem era
recusou a morte em vida,
a sepultura matrimonial.
Borboleta catalogada:
se despregou do quadro e voltou a imprimir
movimento às asas, Suas
.
O voo,
ainda que breve
foi bravo.
............ para Delmira Agustini
.
Se Sylvia, se Virginia
Se Florbela ou Ana Cristina,
Delmira não.
Onde estas sucumbiram -
na asfixia de seu desconforto,
no rio mergulhado com demasiada profundidade,
no eterno sono veronal,
no voo livre e descendente -
ela, num ímpeto de saber-se quem era
recusou a morte em vida,
a sepultura matrimonial.
Borboleta catalogada:
se despregou do quadro e voltou a imprimir
movimento às asas, Suas
.
O voo,
ainda que breve
foi bravo.
Quero #2
Quero ser serralheira,
Como esse da serralheria
no caminho ao trabalho.
Um serralheiro acorda:
serralheiro.
Um serralheiro dorme:
serralheiro.
E, se o telefone toca na casa-serralheria,
ele atende:
- Serralheiro.
Mas esta que escreve:
dorme uma coisa,
acorda outra.
Trabalha no banco,
dando aulas
de uma língua estranha,
para que as pessoas
falem com gente
que não conhecessem.
Escova os dentes: namorada.
Entrou no ônibus: passageira.
Passou da catraca: maestrita.
Tem reunião às 4pm: treinadora.
Casa da mãe: filha.
Hoje é dia dos pais: orfã.
Enquanto isso,
o serralheiro:
serralheiro.
*
“Volver a escribir, después devivir un siglo (tener una hija)
Es como decifrar signos sin ser sabio competente”
Violeta Parra
Esse amor, maior,
quase mata a minha vontade de poesia
que sempre nascia
do vidro dos ossos, do peso do oco.
Tal, tão descrito, amor
abriu qualquer coisa imensa
que quase encerrou o gosto
pelas palavras.
O amor, incondicional, é tão
que um pequeno silêncio de escrita
se fez no peito - onde agora e sempre
caberá mais um.
Surpreendo,
no vermelho das tuas bochechas,
num sorriso mais gengivas do que dentes,
meu coração contrito de passarinho
a se expandir.
Num susto , olho e vejo
que há um novo centro
de onde emanará o poema.
nós que parimos
é, não é fácil
perder a cintura
mudar o centro
alargar o censo
carregar o outro
que é nosso
e todo do mundo
pra nem saber se vai viver,
se vai enxergar
se vai crescer como deve
ou vai entortar
com um ventinho tolo
e ainda assim amar,
no silêncio do sono
toda a imperfeição
que de nós somente
é fruto
e ainda assim
querer que venha
e logo
apenas porque
depois de tudo
precisamos desesperadamente
um lugar pra por todo
o amor.
EuFeminista
Ele perguntou grave:
- Você é feminista?
Assim olhos de fundo de mar.
Ao que revelou suave:
Quero viver a minha uteralidade.
Ser esse caminhar ritmo inconstante como sendo o natural.
Viver o rir gargalhar gritar da instabilidade policística.
chorar chorar calar
Sem imposta retidão hormonal.
Sem eixo x/y do cartesiano masculino.
O sentimento desobstruindo lógicas de estampa de gravata.
Chego ao endereço sem mapa, porque nasci com a bússola por dentro.
Deixa eu domar cabelos e emoldurar sorrisos em troca da tua cara de
satisfação na porta.
Quero mergulhar água de ervas e te esperar desmaiada em besteiras românticas.
Deixa eu falar voz de menos de um grama, assim leve
quase sussurro sempre.
Permita-me, com gentileza, mais alvura, menos peso, menos músculos.
Chorar sozinha na janela enquanto me faço em bolo de teu preferimento.
Deixa eu ler Adélia Prado e a igualdade dos sexos abandonando-me.
- desabafou peso de mundo lastimando ovários.
Luciana Cañete: nasci em Porto Alegre, subi pra Curitiba com a família e fiquei por aqui. Fiz Letras na UFPR, teatro na antiga Escola Técnica da UFPR, especialização em letras pela extinta Gama Filho. Traduzo, escrevo, ensino e amamento a Maria Cecília. O resto é obrigação