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7 poemas de Marcelo De Angelis

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filosofia

viver como se tudo
desse em nada
tudo dissesse nada

e o nada fosse
a única pergunta possível




unoverso

um poema que não nos tomasse
mais do que um único verso
que fecundasse essa noite
numa úmida e só palavra
numa única e só sílaba
menos do que isso

num arfar




serpensar

            ser
             pensar
             sentir
             o vento
             ar
             em repentino      
             movimento
serpente
             ar
             o sentido
o momento

tempo doravante                    
             ciranda
             beatriz & dante
             medida circular
serpente
             inferno
             amante




da natureza das coisas

assim como

            a voz do peixe
            é o murmulho do rio

            a vocação da nuvem
            é dar rosto ao vento

            e do gosto da rosa
            é se paramentar com espinhos

            próprio da tarde mansa
            é devanear o tempo

quem percorre a sombra das coisas
engatinha no segredo delas
e ilumina o livro do dia




da identidade do mar

              álgebra abstrata
cardume de números 
estrutura repetitiva
paradigma marítimo
               caracol labirinto
               algoritmo infinitesimal


algo lívido      nobre   vívido
algo ríspido    forte     bíblico
               algo líquido    lúcido  lógico
algo mítico inédito  nítido


fluxograma narrativo
sequência lógica
               das ondas

máximo divisor comum
              das águas

              iteração:


memória limbo
               memória ram
memória limbo
               memória mar
memória limbo 

memória ram
memória limbo
              memória mar
 
oceano linguagem



ocaso

           o sol se põe
como quem se põe
no lugar de um amigo
           breve instante
           em que a noite
não se opõe ao dia

o ir do sol supõe
antecipar estrelas
solapar trevas
e conspirar silêncios

naquilo que tudo
em tempo se torna
tanta ausência
nem a luz explica

onde eu estava
quando você não veio?



no conforto da noite mais lúgubre

no conforto da noite mais lúgubre
escreve o poeta seu parco legado:
uns rotos e malbaratados versos
uma melancolia que recusa razão

prisioneiro de sua própria infinitude,
sem ponto de partida ou de chegada,
o poeta em si permanece imóvel
enquanto golpeia a mente em vão

aos que tiveram a coragem de se ir
e em noite assim se lançaram do cais
o poeta, coerentemente, lhes diz não

e por entre tormentos e dissipações,
a vida marcada por silente ausência,
perscruta a sombra azul da infância


Ilustrações: Marcelo De Angelis




Marcelo De Angelis é 
natural de Porto Alegre
e radicado em Curitiba,
é formado pela UFRGS
em Comunicação Social
e atua na área editorial.
Desenho e pintura são 
suas outras paixões 
irremovíveis. O tempo,
o devir e essa névoa
que é o indivíduo são 
temas recorrentes em 
sua produção, marcada
por um olhar enviesado,
típico de quem confia
mais na memória,
inventada ou não,
do que naquilo que vê.




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