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Canção para um poema difícil - Lila Maia

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 CALMA E MÚLTIPLA


Chamem a ambulância cotidiana
a vida escapa em grandes doses.
Essa febre no último andar se curva,avança
entre a espessura da felicidade iminente
e as paredes da alma.
O que transborda não me deixa fugir a nado:
há um vazar de raízes me ocupando inteira,
o ponto de partida voltando sempre
(uma parte de mim com a mesma sede).

A ressurreição de cada dia não tem registro
nem um toque de arte-final.




NUDEZ


Dos conflitos e malmequeres constantes
nasceu este cavalo domado que contempla
o homem na varanda,
o descerrar das cortinas da tarde,
e as noites perfuradas
não de um flagrado lirismo
quando meus ouvidos ainda escutavam ternuras,
mas por esta lança sobre meu corpo
órfão, sem a tinta de antes,
sem a cabeça vitoriosa.
Por que ela não acolhe minhas carnes
se o amor ainda é hóspede, rei?




CANÇÃO PARA UM POEMA DIFÍCIL  

         
Palavras perfeitas nascem
amarradas em si mesmas
Trazem o entendimento de mil rosas vermelhas
Dentro de mim nunca são confusão ou segredo
Trespassam a tinta da noite
e estes sonhos pesados sem estrelas
Às vezes resguardam uma transparência
onde os verbos nunca enfraquecem

Palavras perfeitas adormecem
como os santos
Clamam uma força que vem das águas
um sal que alimenta a fome

Palavras perfeitas não pertencem aos poetas.



Os poemas fazem parte da Antologia Sete Vozes.
Ilustração: Patrick O'Brien




Lila Maia  é maranhense radicada no Rio de Janeiro, autora de  As maçãs de antes - Prêmio Paraná de Literatura 2012.

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